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A albufeira de Santa Águeda: 25 anos a abastecer de água C. Branco

Benedicta Maria Duque Vieira - 06/10/2016 - 9:43

Em Janeiro de 1986, há portanto 30 anos, começaram as obras nos terrenos de Santa Águeda, em Póvoa de Rio de Moinhos, para a construção da barragem então chamada da Marateca, por um equívoco já explicado  por um dos responsáveis pela obra.

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Em Janeiro de 1986, há portanto 30 anos, começaram as obras nos terrenos de Santa Águeda, em Póvoa de Rio de Moinhos, para a construção da barragem então chamada da Marateca, por um equívoco já explicado  por um dos responsáveis pela obra. A previsão de tempo para a conclusão dos trabalhos era de dois anos e um mês, e a excitação com a decisão de avançar foi tal que um articulista a comparou à passagem do Rubicão por Júlio César – Alea jacta est.  “O Ocreza também é um rio e em ambos rumorejam as mesmas águas”. O entusiasmo compreende-se: em 1980 e 1981, houve períodos em que os habitantes de Castelo Branco só tinham água nas torneiras entre as cinco e as sete horas da manhã.  
Naquele ano de 1986, no decurso das obras, descobriram-se no local importantes vestígios histórico-arqueológicos que sobressaltaram a comunidade estudiosa, temerosa de nova batalha como a recentemente travada em torno do complexo de arte rupestre do Vale do Tejo. Preocupada com a destruição irreversível de um património milenar, ainda houve quem sugerisse na imprensa – Ponte romana condenada, só uma hipótese: a “transplantação”.    
Nos meses seguintes a realidade impôs-se. Na Sant’ Águeda, “um cenário colorido e frenético”, 80 trabalhadores diários, declarações esperançosas do Presidente da Câmara (“não vamos ter falta de água a partir de 1988”) e, com os arqueólogos debaixo de um sol escaldante, o prosseguimento de uma escavação de emergência. Finalmente, em Outubro de 1989, entrou em funcionamento a Estação de Tratamento da Barragem, com inauguração oficial, pelo Secretário de Estado do Ambiente, em 25 de Novembro. 
No Verão de 1991 já toda a cidade dispunha de água com qualidade. 
Sendo premente o abastecimento hídrico a Castelo Branco, questão que se arrastava há décadas, a opção adoptada trouxe, à época, constrangimentos grandes a parte da população da Póvoa e prejuízos ao conjunto da povoação. 
Globalmente, a albufeira alagou centenas de hectares de campos agrícolas utilizados para pastorícia, soterrou dois dos mais marcantes elementos patrimoniais da Póvoa – a ponte romano/medieval e a capela secular de Sant’ Águeda – e as expropriações, nomeadamente para a abertura de caminho alcatroado (durante muitos anos, a denominação da estrada entre a Póvoa e o nó da Lardosa), diminuíram propriedades; dividiram outras, chegando a deixar, pelo menos numa delas, o poço de um lado e a casa do outro; reclamaram, para alojar quadros superiores e os escritórios da empresa construtora, a casa de veraneio do proprietário de um monte, a Quinta do Bom Pastor – Bica, que hoje em dia, pelo estado de abandono a que parece votada, mete dó a quem a conheceu, estimada como poucas, em décadas anteriores. Acresce que, como teria sido lógico e de esperar, não sendo a expropriação acompanhada de registo imediato nas Finanças e na Conservatória, casos houve em que as diligências para a regularização da situação predial criada demoraram anos. Alguns “lesados” tiveram ainda de suportar, além dos custos, insinuações sobre a sua própria responsabilidade nessa falha.
Foi em nome de um bem maior colectivo que os proprietários dos terrenos da Póvoa atingidos – uns, com sacrifício, outros, com a tradicional complacência com o que consideravam ser uma obrigação social sua – compreenderam e aceitaram o que lhes era proposto. É por essa mesma razão moral que, agora, não se aceita que se sobreponham interesses particulares a esse bem maior colectivo, então, evocado. 
Em finais de 2014 tocou uma primeira vez a rebate. Um grupo informal e independente, Amigos de Póvoa de Rio de Moinhos, seguiu com empenho a contestação pública generalizada e promoveu, a 3 de Maio de 2015, na Casa da Cultura, uma sessão de esclarecimento da população da Póvoa orientada por especialistas, nomeadamente um técnico da Agência Portuguesa do Ambiente.    
Conhece-se agora uma segunda arremetida que, aparentemente, não respeita o que ficou registado na altura (solo rural, culturas arvenses, olival, carvalhos e alguns sobreiros, edifício de uso geral, principalmente não residencial, com área bruta de construção de 95,70 metros quadrados, possibilidade de aproveitamento para fruticultura, sujeição aos condicionalismos impostos pelo Plano de Ordenamento da Albufeira). Também se sabe, e de fonte fidedigna, que os mesmos interesses particulares se perfilam, de novo, exibindo documentos comprovando a multa aplicada de 64 euros! e o licenciamento de projectos com implicações de teor idêntico ao que justificou a reprovação anterior. 
Com que retaguarda poderosa conta alguém para se permitir tão intolerável petulância?

Benedicta Maria Duque Vieira (coordenação) Póvoa de Rio de Moiinhos- Ontem e Hoje. História e Memória, Castelo Branco , RVJ, pág. 24. Para informação sobre aspectos técnicos da construção de “um dos empreendimentos mais marcantes da região no século XX” ver artigos de Manuel Castel-Branco, pp.22-24 e de José António Afonso Calmeiro, pp.59-64.

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