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Cata-ventos: Barrocal - Para que te quero?

Costa Alves - 04/01/2018 - 9:27

Não encontro ninguém, entre pessoas e instituições, no nosso país e no mundo, que não deseje que os seus patrimónios materiais e imateriais sejam preservados e reconhecidos pela UNESCO. O nosso país é um exemplo de exemplos e ainda há pouco o Alentejo trouxe-nos mais um: Estremoz. 
Conheço uma exceção: a Câmara Municipal de Castelo Branco (CMCB). 
Em setembro de 2013, o então presidente Joaquim Morão anunciava (e a Assembleia Municipal aprovava) a aquisição de 50 hectares na área do Barrocal com o objetivo de os vir a integrar no Geopark Naturtejo, classificado pela UNESCO. Seria o primeiro geossítio a ser reconhecido no território albicastrense e mesmo às portas da cidade.
Seria de esperar que uma candidatura ao reconhecimento como parque natural, pela UNESCO, deste ecossistema politemático fosse precedida de estudos científicos de avaliação (em alguns casos iniciados há muito) das suas valências arqueológicas, geológicas, botânicas, zoológicas e hidrológicas. Somente após a sua realização é que a CMCB estaria habilitada a tomar a decisão política de apresentar a candidatura do Barrocal a reconhecimento pela UNESCO. E só nessa altura poderia iniciar o trabalho de arquitetura paisagística no local, obviamente seguindo as coordenadas matriciais daquela organização da ONU. 
Não foi assim que a CMCB procedeu. Começou justamente pelo fim, sem saber se a intervenção que está a fazer (e é tamanha e custosa) colide com os conceitos e procedimentos exigidos nas intervenções em territórios que aspiram a ser instituídos como monumentos naturais por aquela organização das Nações Unidas.
Concluo que a filosofia do projeto, assumida em 2013, sofreu uma transformação que a colocou na opção oposta, isto é, na figura de parque urbano; mais um parque urbano entre os vários parques que a cidade possui sem atrair pessoas para os povoar. Tudo indica que o acréscimo de urbanização prevista irá apertar o cerco ao Barrocal e será ocupado à custa do esvaziamento de outras edificações. Será mais despovoamento a acrescentar ao crónico despovoamento de várias zonas da cidade. 
Registo que o projeto de arquitetura paisagista não foi objeto de discussão pública. A CMCB entendeu que se trata de (cito-a) “uma obra de mera requalificação urbanística.” Sublinho: “mera requalificação urbanística”. Já não um parque natural, como ainda há meses a designava, mas uma demonstração da subversão da filosofia enunciada e aprovada pela CMCB (e pela Assembleia Municipal) em 2013.
Também registo que não foi efetuado um estudo de impacto ambiental, pois a CMCB entendeu que legalmente não carecia dele. Ou seja, considerava-a uma obra de rotina que não possuía, a seu ver, a diversidade arqueológica, geológica, botânica, zoológica e hidrológica para merecer ser estudada, classificada e preservada. 
A CMCB está a intervir nesta fase em 11 hectares e prevê o seu alargamento à totalidade em duas fases ainda não definidas. Fá-lo como se o espaço não possuísse a identidade de um sistema sensível e valioso de que não cuidou ao longo de décadas. Um sistema de grande diversidade com uma valia única que singulariza a cidade no todo nacional. 
Não sei se o grau de intervenção (e devastação) impedirá uma reversão (palavra importante nos últimos dois anos) desta intervenção da CMCB. Ainda quero sonhar com um futuro em que o Barrocal de Castelo Branco seja considerado pela UNESCO um geossítio e um parque natural integrado no Geopark Naturtejo.
mcosta.alves@gmail.com

 

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