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Cata-Ventos: Ai Barrocal, Barrocal!

Costa Alves - 07/12/2017 - 9:26

Em julho, quando o Cata-Ventos me trouxe a preocupação pela intervenção que a Câmara Municipal se propunha fazer no Barrocal, estava longe de imaginar que o “parque natural”, a que o Presidente aludia nos jornais locais, não era um parque natural. 
Mas, tinha dúvidas e aqui fica parte do que escrevi: “Um parque natural não é um parque urbano. Muito menos um parque de diversões. Portanto, não lhe mexam muito. Mexam-lhe apenas o necessário e com bom senso para que possamos relacionar-nos naturalmente com ele não ferindo os seus equilíbrios. Construir infraestruturas? Só as mínimas e, por favor, não metalizem. Dissimulem o mais possível tudo o que fizerem, utilizem os materiais mais leves, mais próximos ou mais familiares dos que estão lá. E não berrem nas cores nem intervenham como se quisessem fazer cidade ali.”
Veio a campanha eleitoral e nada adiantou. O presidente do município gastou algumas palavras de autoelogios ao projeto e os partidos de oposição não interrogaram, não investigaram, não disseram. Como é costume. Sem informação técnica e sem conhecimento público, o assunto parecia pacífico.
Até que, a 8 de novembro, alguém publicou uma fotografia elaborada pela empresa projetista (Topiaris) que concebeu, por ajuste direto, a intervenção. Confesso que a fotografia do escorrega-para-a-areia me disse tudo. Saíra numa revista a descrição e ilustração que até anunciava um anfiteatro com 250 lugares. Era de mais.
O único olhar dos vários executivos municipais ao longo de décadas resultara na amputação de mais um pedaço de Barrocal em troca de uma circular rodoviária. Agora, estão a mexer tanto naquele território de património arqueológico, geológico, botânico, zoológico e hidrológico que o desfigura inutilizando-o, enquanto parque politemático diferenciador e referenciador da cidade.
Perguntei a quem sabe se as várias ciências tinham sido chamadas a efetuar estudos; a resposta foi não. Perguntei se tinham tido em consideração trabalhos e propostas elaboradas há anos e a resposta foi a mesma. Também indaguei se as escolas, do ensino superior ao secundário e básico, se tinham pronunciado antes da decisão política. Resposta também negativa.
Há peças de habitats do Neolítico à Idade do Bronze depositadas no Museu Francisco Tavares Proença, sem que tenha havido uma verdadeira missão de prospeção e estudo no que poderia vir a constituir-se como uma estação arqueológica.
A Geologia é uma vertente de fortíssima representatividade do Barrocal na área do Geopark Naturtejo e estranho a passividade desta instituição face à tipologia descaraterizadora da intervenção camarária.
Há leis que impõem a consideração dos habitats botânicos de interesse público e também da defesa da avifauna e sua circulação. E há, ainda, a considerar a importância da água neste ecossistema, marcada pela existência de uma charca cuja sobrevivência não foi analisada nem garantida. 
A CMCB não quis optar pela classificação do Barrocal como área protegida de interesse municipal. Não quis assegurar a proteção dos valores naturais na integridade das suas feições politemáticas e criar condições para investigação, estudo, educação ambiental. Um Monumento Natural como este, ambientalmente respeitado e sustentável, seria referencial da cidade e aumentaria a sua projeção e atratividade.
Não é fácil encontrar um sítio com as polivalências do Barrocal. Vão a Malpartida de Cáceres, Trujillo, Vila Nova de Gaia, por exemplo, e verão parques que preservam a idiossincrasia do lugar e a sua função social. Não os submeteram à voragem de projetos urbanizadores de interesses privados.

mcosta.alves@gmail.com

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