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Cata-Ventos: Alexander Fleming em louvor da Ciência

Costa Alves - 05/01/2017 - 9:40

Se algum dos meus amigos possui sapatos bolorentos, peço-lhe que mos dê”. Conta o escultor inglês Jennings que este foi o pedido feito certo dia, por Alexander Fleming, aos amigos que se reunem no Chelsea Arts Club de Londres. Quiseram saber para que queria sapatos bolorentos mas o mistério ficará guardado: “Para uma coisa que estou a fazer no laboratório.”
Estes tempos de hoje, tão marcados por infeções com origem bacteriana e pela sua cada maior resistência ao tratamento antibiótico, fazem-me recordar o trabalho deste médico bacteriologista tão pouco reconhecido no nosso país. Antes da revolução que empreendeu, o mundo era completamente diferente e a esperança de vida bem menor. Com a descoberta da penicilina, por antibiose, Fleming dá um passo enorme para melhorar a nossa vida.                                                                                                                                            Por um feliz acaso (há felizes acasos em todos os campos e também em investigação científica) tinha verificado que o bolor, um ser vivo rudimentar, produzia uma substância que matava outros seres vivos: as bactérias. Pasteur, outro grande vulto que já tinha feito avançar as ciências biomédicas, costumava dizer que “o acaso só favorece os espíritos preparados.” Este acaso foi aproveitado pela intuição, preparação, capacidade de observação e experimentação deste médico investigador escocês que fixou toda a sua vida na perseguição de um objetivo que antevira como alcançável. 
Em 1928, Fleming continua a palmilhar com persistência os caminhos que o tinham conduzido à descoberta, em 1923, de uma substância, lisozima, que lhe deu muitas esperanças. Era uma espécie de enzima antimicrobiana que encontrou no muco nasal e nas lágrimas.
Na altura, pensa-se que qualquer substância perniciosa para as bactérias destrói também tecidos humanos mas Fleming não segue esta formulação. Sabe que não pode continuar a combater uma infeção com origem bacteriana, como se tivesse origem viral, através da imunização e aumento das defesas naturais do corpo. 
Percebe que o acaso, que o despertara para o estranho poder do bolor, é o raio de esperança que o levará, durante 15 anos, a orientar a sua pesquisa para experimentação e mais experimentação, antes de encontrar uma equipa de químicos, já a II Guerra vai alta, que irá purificar isolar e preparar a concentração terapeuticamente adequada. 
Entre 1928 e 1943, vai realizando conferências e publicando os resultados do que investiga mas a comunidade científica não aprova o seu caminho. Acha que só terá utilidade no tratamento de infeções banais e não lhe presta atenção. E, sem esse reconhecimento, não obtém recursos financeiros para aperfeiçoar o produto, pois a obtenção e purificação, a partir dos seus cultivos de penicilina, resultam difíceis e mais apropriadas para os químicos que não tem à disposição. 
Fleming não regista a patente da sua descoberta, pois acha que assim será mais fácil a difusão de um produto necessário para o tratamento de tantas infeções bacterianas. Já depois da sua consagração, em 1945, com o Prémio Nobel, quando invectivam o governo inglês por não lhe ter atribuído a recompensa de cem mil libras que destinara, no imediato pós-guerra, a cada general, a sua reação é exemplar: “E para que queria cem mil libras? Tenho tudo o que é preciso.”

mcosta.alves@gmail.com

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