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Centenário das aparições (7): Fátima na era da globalização

Florentino Beirão - 14/06/2017 - 9:51

Nas décadas de 50/60, Fátima foi-se consolidando e expandindo. Para tal, muito ajudou a relação de Fátima com Pio XII, a envolver-se nas aparições, através dum enviado à Coroação da imagem da S.ª de Fátima em 13.05.1950, bem como ao encerramento do Ano Santo em 13.10.1950. Na mensagem papal já foram referidas as viagens das 13 imagens peregrinas que andavam a percorrer o país e o mundo. Ao concelho de Castelo Branco, chegou em 1951. Anos depois, o que viria a ser o papa João XXIII, deslocou-se a Fátima em 13.5.1956, para presidir às celebrações do 25.º aniversário da consagração de Portugal ao Imaculado Coração de Maria. Seria uma marca “indelével” na sua vida. Num clima de exaltação fatimista, no final da década de 50, em 1958, Américo Tomás - a competir com Umberto Delgado na campanha para as eleições presidenciais - decidiu aproveitar-se de uma peregrinação nacional, para se mostrar ao país devoto, aparecendo, em lugar de destaque, na Cova da Iria.  No início da década de 60, em 13.10.1962, o Vaticano declarou N.ª S.ª de Fátima padroeira da diocese de Leiria. Mais tarde, em 13.05. 1967, com Portugal plenamente envolvido na guerra colonial, Paulo VI, em clima de tensão com Salazar, visitou Fátima como peregrino, juntando-se às comemorações dos 50 anos das aparições. Note-se que ao longo da guerra colonial, predominou, por parte dos peregrinos, o cumprimento de promessas relacionadas com este conflito. Simultaneamente, com os problemas de uma emigração clandestina elevadíssima para a Europa, as famílias fizeram de Fátima um espaço de devoção de famílias aflitas. Porém a partir de 1968, já não eram só os republicanos radicais a contestar Fátima. Também no seio dos católicos progressistas e de alguns padres, começaram a surgir vozes críticas contra o fenómeno das aparições, acusando o clero de promover “um culto mágico”, de tornar a religião “utilitária” e “com cumplicidade com o regime salazarista”. Com a Revolução do 25 de abril de 1974, Fátima e a política não beliscaram as suas relações. Aprendeu-se com a dolorosa lição da 1.ª República maçónica. Contudo, as peregrinações nesta altura acabaram por diminuir. Internacionalmente, seria sobretudo graças ao mariano papa João Paulo II que se deslocou à Cova da Iria em 1982, 1991 e 2000 que a devoção à Virgem de Fátima mais se expandiu. O ponto mais alto destas visitas deu-se em 13.05.2000, com este Papa a proclamar os irmãos Francisco e Jacinta, “devido às suas qualidades espirituais”, como Beatos da Igreja. Mais tarde, a antiga relação da mensagem de Fátima contra o comunismo foi realçada na altura da destruição do Muro de Berlim em 1989 - construído em 13.08.1961 – tendo o santuário adquirido e ostentado um pedaço desse muro no recinto da Cova da Iria. Entretanto, este espaço ia-se embelezando e enriquecendo com a construção da monumental basílica da S.ª Trindade, inaugurada em 2007. Em 2004, retirou-se a anterior “Cruz Alta” e ali foi colocada uma mais empolgante e moderna, perto da nova basílica que alberga 8.633 fiéis. 
Eleito Bento XVI, entre 11 e 14 de maio de 2010, este novo Papa também se deslocaria à Cova da Iria e aqui interpretou teologicamente, a 3.ª parte do “Segredo de Fátima”. Para responder a uma devoção dos peregrinos, em 2013 o Santuário adotou o branco “Lenço do Adeus” para saudar a Virgem e limpar as lágrimas dos peregrinos, na emotiva procissão do adeus. Como fomos verificando, partindo de uma simples mensagem a três crianças pobres e analfabetas, Fátima foi sempre tendo capacidade para incorporar novas mensagens, metamorfoseando-se, face ao evoluir dos acontecimentos, envolvida por um substrato ancestral de religiosidade popular. Embora dentro de alguns membros da Igreja se tenham levantado dúvidas, incertezas e fortes críticas às aparições, uma grande parte do povo crente, sempre deu corpo a esta devoção. Finalmente, a presença do papa Francisco em 12-13 de maio de 2017 em Fátima, canonizando Francisco e Jacinta, na presença de cerca de um milhão de peregrinos, foi mais um momento alto nesta onda devocional, onde a religiosidade popular e o Vaticano se uniram, convivendo embora com um próspero e agressivo negócio turístico, por vezes raiando o escandaloso. Quanto a nós, difícil senão impossível, será apurar-se a verdade, nua e crua, sobre esta experiência religiosa subjetiva das “místicas visões” das crianças, sempre sujeitas a arranjos, interpretações e a novos olhares. O que é espiritual é da ordem do espiritual. Hoje, Fátima na era da globalização, aí se encontra pujante, a desafiar os novos tempos, repletos de medos e incertezas, em busca de Paz e Esperança. 
florentinobeirao@hotmail.com 

 

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