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Crónica: Debita nostra LXI

Luís Costa - 11/05/2017 - 14:24


Léon Blum, em 1936, iniciava a primeira experiência governamental dos socialistas em França com um misto de esperança e apreensão. ‘Trata-se de saber se será possível arranjar uma ponte de passagem, uma ligação, entre esta sociedade e aquela cuja realização definitiva constitui, enfim, o nosso desígnio e o nosso objetivo’. (J. Touchard, História das Ideias Políticas, 1959, vol. 7, pp. 99).
Se a derrota do nacionalismo autoritário vai permitir, no pós-guerra, uma primeira reabilitação da lógica liberal, nem por isso dará lugar ao desenvolvimento dos partidos assumidamente liberais. Porém, ela irá ganhar um caráter de tal modo hegemónico que a coloca na berlinda das demais forças políticas. 
Quer assenhoreando-se progressivamente do discurso das correntes conservadoras ou reformistas, quer constituindo-se como o inteiro negativo do que a imagem das correntes revolucionárias ousaria revelar. Não admira, pois, que fosse o colapso das mais marcantes experiências do internacionalismo revolucionário a proporcionar-lhe um segundo alento.
Ora, se a relação entre a perspetiva reformista, no seu caráter multifacetado (DEBITA NOSTRA LIII), e a revolucionária do socialismo nunca foi fluída, houve uma situação que desde cedo a perturbou: uma significativa adesão eleitoral e a possibilidade de participar da ação governativa. Governar ficando muito aquém (iludindo/traindo) do que só a revolução poderia alcançar, ou preparando no dia-a-dia o advento de uma alternativa social.
É com esse dilema que ainda em 1936 Léon Blum se confronta, ao formar governo de unidade disposto a enfrentar a vaga nacionalista que varria a Europa, apesar de o diferendo entre aquelas duas conceções estar de há muito consumado. De qualquer modo, nem por isso a sua experiência deixa de ter um interesse conclusivo. Desde logo, porque se não apresenta com qualquer intuito remendão, mas com o de pretender uma real alternativa.  
Depois, porque se revela uma experiência frustrante, com duas imediatas consequências. A de atiçar os seus opositores: quer os que consideravam que se fora longe demais; quer os que apostavam num ilimitável esticão reivindicativo, para sustentar a inevitabilidade da revolução. E a de o levar a constatar as imensas dificuldades do caminho que encetara, mas também a considerar que só o reformismo seria ‘revolucionário, na medida em que dava tempo as pessoas para se adaptarem’.
Depois ainda, porque, como denota a anterior referência, manifesta alguma má consciência em relação ao abandono da identidade revolucionária. O que releva da sua inspiração marxista, mesmo que o corte com o comunismo já remonte a 1919, aquando da constituição da III Internacional. Ou, mais provavelmente, à revolução alemã, desse mesmo ano, e à sua tentativa de replicar a revolução russa de 1917, sendo que os ‘bolcheviques’ seriam agora ‘mencheviques’ (minoritários), já que os comités de base eram em maioria social-democratas. 
Lá iremos. Mas não sem uma breve referência às transformações no mundo trabalho.

 

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