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Crónica: Debita Nostra LXX

Luís Costa - 14/09/2017 - 10:21

Hoje em dia, sabemos que essa ideia (Estado-social) só foi realizada, de facto, no âmbito do Estado-nacional, porém, a partir do momento em que ele se vê lançado no contexto modificado de uma economia e de uma sociedade mundial, atinge os limites da sua capacidade de realização. A partir de aí, entra em jogo, de um lado, a domesticação política do capitalismo global desenfreado; de outro, o único exemplo de uma democracia regional que funciona precariamente. Seria possível ampliar essa forma de influência democrática das sociedades sobre si mesmas para além das fronteiras nacionais? (J. Habermas, “Era das Transições”, 2003, PP. 102-103).
Se o liberalismo sempre cuidou, muito convenientemente, da má-fama do Estado e se a incapacidade deste para o controlo de novos fluxos económicos e políticos, ajudou à tarefa (DEBITA NOSTRA LXIX), há algo que tão pouco o beneficia: a ideia da ancestralidade daquilo a que hoje chamamos Estado. 
Tal convicção acaba por iludir a sua inexistência, até ao séc. XV, e por fazer esquecer o demorado processo que foi o da sua apropriação democrática (DEBITA NOSTRA LVI), bem como o da mais recente e restrita gesta pública que lhe granjeou o epíteto de Estado-social.
Acontece que o presente contexto, de uma economia e de uma sociedade globais, confronta o Estado com outros desafios que não só o levam a atingir os limites “da sua capacidade de realização”, como diz Habermas, mas põem mesmo em causa a sua tradicional intervenção. Quer enquanto protagonista de uma circunscrita generosidade social, quer ainda, embora de forma velada, enquanto garante de um mais divulgado procedimento democrático. 
Assim, o maior de todos os desafios será certamente o da “domesticação política do capitalismo global desenfreado”, já que, como também refere Habermas, o Estado é ainda o reduto da realização democrática e da sua mais específica vertente social. 
Mas não só. O Estado constituiu-se ainda como o depositário de arreigadas e arduamente conseguidas identidades nacionais (cf. José Mattoso, a “Identificação de um país”), parte indispensável para qualquer resposta àqueles desafios, sobrelevando a lide do património e da energia identitária que congrega.
É claro que se pode sempre tentar viver da saudade do que Estado ainda é, ou da memória do que ele nunca foi, se o tempo se prestar a tais sobrevivências (DEBITA NOSTRA XXXIII), ou a que se tentem reeditar improváveis, se é que apetecíveis Albânias.
Mas, o que fica por explicar, é porque que é que há de ser mais fácil reunir vontades democráticas, estando fora e não dentro “do único exemplo de uma democracia regional”, funcionando embora “precariamente”. Se é que se pretende, com a secular persistência com que se fez o Estado democrático e social, “ampliar essa forma de influência democrática das sociedades sobre si mesmas, para além das fronteiras nacionais”

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