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Crónica: Debita Nostra XC

Luís Costa - 28/06/2018 - 9:30

"As minhas preocupações e expetativas é que as próximas semanas mostrem que os mercados, as taxas das obrigações e a economia italiana podem ser tão drasticamente atingidas, que isso vai servir para indicar aos eleitores para não votarem nos populistas de direita e esquerda’, disse Oettinger numa entrevista à estação de televisão Deutsche Welle”. (Diário de Notícias, 30 de maio de 2018).

O que levará um comissário alemão a contrapor a ameaça dos mercados aos resultados de umas eleições? Provavelmente uma peculiar conceção de democracia ou, na melhor das hipóteses, a convicção de que ele próprio se encontra encartado de um mandato democrático, resultante do compromisso entre países que o são.

Mas, neste caso, ignorando um princípio que qualquer iniciado no ciclismo já domina, mesmo nada sabendo sobre o alemão ‘gestaltismo’. Ainda que uma fuga seja a do ciclista mais veloz, nem por isso deixa de estar à mercê do esforço conjugado do pelotão. Ou seja, de que o todo é diferente da soma das suas partes e que não é de um somatório de democracias que a democracia se faz.

Ora, a análise do populismo também se não pode desligar dos pressupostos sobre o que é a democracia, da real hierarquia de valores que lhes subjaz e de que, no dia-a-dia, fazem não declarada demonstração.

Sendo geralmente admitido que o exercício democrático não é uma mera formalidade, e pressupõe um conjunto mínimo de condições de equidade e qualidade de vida, a que se deve a obsessiva resistência a tê-las em consideração?! Desde logo, quando invariavelmente se cotejam os países pelo seu PIB, relegando outros disponíveis instrumentos de medida, mais atentos à distribuição da riqueza e aos consequentes indicadores sociais.

Por outro lado, são hoje reconhecidas as vantagens do livre comércio, pela sua capacidade de contenção dos preços e uma ‘generosa’ irradicação da pobreza extrema. Então, em conformidade, porque se não caldeia o sempre pragmático ‘desprotecionismo’ com um critério democrático, libertando também os mais pobres do “dumping” social e político de que tão perversamente (des)aproveitamos?!

E porque se prefere, na nossa UE, um menos idóneo sistema bancário, a emprestar diretamente aos estados-membros que lhe têm valido?! Por estes se encontrarem sujeitos ao escrutínio democrático?

Configura-se, assim, uma fundamental contradição que põe em causa a conveniente ideia do imediato parentesco entre liberalismo e democracia. Por um lado, pretende-se que as democracias decidam sobre a melhor maneira de perderem recursos, por outro, são cada vez mais afastadas da responsabilidade decisória de os afetar. 

E, agora que a dividida Alemanha sente cãibras e se confronta com fugitivos cada vez mais velozes, talvez se possa superar esta tática do simples somatório do que é diferente. Ou a dos seus aliados… que sempre foram entendendo que, nisto do pelotão, é cada um por si!

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