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Digressões Interiores: Aquela tarde, dentro e fora do tempo

João Lourenço Roque - 12/10/2017 - 8:00

A vida é assim! Feita de coisas certas e incertas; de rotinas e surpresas. Ainda não esqueci – como poderia esquecer – aquela tarde repetida e irrepetível, a 16 de Setembro, na vila de Sarzedas, em que ocorreu o lançamento do meu livro Digressões Interiores 2, construído com as crónicas publicadas no “Reconquista” entre 2011-2017. 

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A vida é assim! Feita de coisas certas e incertas; de rotinas e surpresas.

Ainda não esqueci – como poderia esquecer – aquela tarde repetida e irrepetível, a 16 de Setembro, na vila de Sarzedas, em que ocorreu o lançamento do meu livro Digressões Interiores 2, construído com as crónicas publicadas no “Reconquista” entre 2011-2017.

Bem achado e criativo o título da reportagem do jovem jornalista José Furtado: “Crónicas viajam do jornal para o livro”.

Se prosseguir nos caminhos da escrita, bem gostaria que aquele título voltasse a repetir-se e a fazer sentido.

Volvidos seis anos, outro livro.

Diferente e semelhante ao anterior.

Outras viagens, quase sempre nas mesmas rotas e no mesmo tom.

Viagens nas palavras e nas imagens, captadas e recriadas pelo meu filho João Filipe.

Viagens por esta “pátria interior”- talhada no xisto e no granito, no sol e no vento, na água das fontes e das ribeiras -, contruída há muitos séculos por gente corajosa, bem rija e morena.

Viagens anunciadas ou clandestinas, sem bilhete ou passaporte, quase sempre principiadas nos Calvos, de onde tão jovem saí sem ter saído e aonde regresso sem regressar…tantas vezes apanhado nas lembranças e nas saudades de Coimbra.

Cidade sem igual, de que todos os dias me despeço sem nunca me despedir… vida é assim, feita de voltas e reviravoltas.

Quem diria que o menino dos Calvos, que gostava de trepar às árvores e esconder-se nos ramos mais altos das oliveiras como se fosse um tentilhão, tinha destino marcado em Coimbra…

Aulas, segredos e romances nos anfiteatros e nos corredores da Faculdade de Letras.

Quem diria que, após tantos anos nos palcos universitários, a aldeia novamente me chamava e prendia.

Quem diria que de tanto interrogar a história universal, dava por mim a interrogar-me e a interrogar a vida nas histórias sem história, histórias minhas e dos meus vizinhos, ora tristes ora divertidas, dentro e fora do tempo.

Histórias simples – às vezes tão complexas e contraditórias.

Outras formas de olhar o mundo e a vida, em antigas e novas redes socias.

Em Maio de 2011, o primeiro livro de crónicas.

Em Setembro de 2017, o segundo livro. Livros aos pedaços, pedaços de vida em círculos de vidas reais e imaginárias.

Histórias romanceadas, contos sem conta, sem princípio nem fim.

Digressões e transgressões – terrenas e sobrenaturais – de pendor lírico e poético, marcadas pela minha sensibilidade excessiva, tocadas pela sedução e pela beleza feminina.

Sempre as mulheres, ai as mulheres! Doideiras as minhas, doideiras de um velhote que perdeu o espelho e já nem sabe a idade… Devaneios ou pecados de um romântico sem remissão? Deixo a escolha a cada um dos leitores.

Por mim, acrescentarei que a minha devoção pelo universo feminino também se prende com o papel dominante das mulheres que tanto marcaram e marcam os territórios e os rituais albicastrenses no quadro familiar, social, religioso e cultural. Mulheres corajosas e lutadoras; mulheres ora rebeldes ora submissas, tantas vezes incompreendidas e sacrificadas, a quem singelamente rendo a minha homenagem.

Surpreso e emocionado – emocionado até às lágrimas, lágrimas minhas nos teus olhos- regresso àquela tarde de 16 de Setembro, no salão da Junta de Freguesia.

Regresso à sessão de lançamento do meu novo livro – talvez o último-, em que (vá lá saber-se porquê) continuo a espalhar e a esconder a minha vida, a nossa vida.

Sessão inesquecível, ali na “vila condal”, com direito a “casa cheia”, que teve o melhor e o maior momento na belíssima e original “Digressão” da Dr.ª Celeste Rodrigues, “através das minhas digressões”, que tantos aplausos e emoções desencadeou, cujos ecos ainda não se apagaram, guardados na alma e na memória.

Em boa hora insisti e tornei a insistir para que se dignasse fazer a apresentação.

Nem sei o que dizer-lhe, nem sei como agradecer-lhe… Singelamente aqui lhe deixo mais uma palavra de profunda e sentida gratidão.

Gratidão que estendo a todos os que ali vieram dar-me algum do seu tempo e trazer-me palavras generosas.

A todos eles – familiares e amigos, conhecidos e desconhecidos – gostaria de voltar a dizer-lhes o que então lhes disse ao findar a minha arenga desmedida: Bem hajam, do fundo do coração, e até sempre, em qualquer sítio, em qualquer afecto ou pensamento.

Perto ou longe da vila de Sarzedas e da cidade de Castelo Branco.

Perto ou longe das paixões de Coimbra e da Torre da Universidade. Perto ou longe de outras histórias que gostaria de imaginar, ao pé da buganvília florida, atrás do balcão da casa do João Filipe, ou nas águas do rio Ocreza.

Perto ou longe do toque das concertinas na romaria de São Domingos e da música comovente das bandas filarmónicas em dias de procissão.

Perto ou longe de outras tardes, surpresas e nostalgias, nas margens e nas cores do Outono.

A vida é assim! Na lentidão do tempo breve e das memórias fundas, a vida mais corre. Enquanto corre e não corre, faço de conta que sou o que não sou.

Fechado o livro, voltei aos dias vulgares, aos dias sem dia. Ainda em setembro abasteci-me de pinhas e lenha, encomendei nozes de Penela, enchi o pipo de vinho e plantei as couves do Natal, com a ajuda da Piedade.

Em 1 de Outubro, outro dia desigual.

Meti-me no carro e fui votar nas eleições que para mim mais valem.

Nas Sarzedas e em Castelo Branco, ganhou quem merecia ganhar – obra feita, promessas cumpridas; confiança redobrada, garantias de mais e melhor futuro sempre no mesmo caminho.

Mas os que apresentaram e defenderam outros compromissos e outras ideias também merecem o meu apreço, porque em democracia todos contam, todos são necessários, salvo os que desistem de participar na vida comunitária.

Não tenho emenda, demasiado longa vai a minha crónica – a segunda à espera de viajar para outro livro. Não tenho emenda, ai as paixões, sempre as paixões nas cartas e nas cantigas de antigamente: “Eu peço a Deus que me leve/ Para longe desta aflição/ Tudo nasce e tudo morre/ Só este amor é que não…”

COMENTÁRIOS

Maria Beatriz Menezes
à muito tempo atrás
Surpreendida estou por esta confissão tão leve e tão rica , do próprio autor das Digressões Interiores 1 e 2., Dr. João Roque. Não parou de escrever, uma grande variedade temática, sempre a vitalidade e a grandeza estilística. Penso que é urgente dar forma de Livro, 3 , às crónicas publicadas no Jornal Reconquista e , outras se existem , para serem lidas , relidas ....nos nossos momentos em casa , às horas avulsas; ter na estante todo o manancial escrito pelo meu Grande Colega e Amigo, Grande Escritor vivo . Será um orgulho para a nossa geração , e, claro para as futuras.......O Livro tem que nascer, ou as crónicas não sabem viajar do Jornal para a minha casa......????
Maria Beatriz Menezes
à muito tempo atrás
Tenho lido e comentado várias Crónicas da autoria do dr. João Roque, Meu Colega que foi e Amigo que é, dignas de serem condensadas em Livro 3. `´É um prazer ter a obra completa de um prosador- poeta. Espero ainda ter o prazer de obter o Livro. Uma saudação .