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Migrações na Europa (1): Uma história multicultural

Florentino Beirão - 05/07/2018 - 10:08

Uma das questões que hoje mais interpela boa parte dos países é o premente e acutilante problema das migrações e o acolhimento de muitas populações à deriva. Só em 2017, somavam 2,9 milhões. A resposta de alguns países da UE a esta trágica realidade, por motivos ideológicos ou eleitorais, tem sido encerrar fronteiras ou criar dificuldades de acesso às pessoas que fogem da guerra ou da fome. Enquanto alguns países os recebem, solidariamente, de braços abertos, outros, numa atitude xenófoba e desumana, fecham-lhe as portas. Felizmente, este comportamento egoísta tem mexido com a consciência de muitos, inconformados com esta trágica e desumana realidade. Tanto a nível das emoções, mas sobretudo, da racionalidade e do que nos ensina a longa história do velho espaço europeu. Sobre este último aspeto nos vamos debruçar, ainda que sucintamente. O que nos ensina a história, na sua longa duração, a este respeito? Como se foi povoando a Europa, berço de várias populações, ao longo dos milénios?
Segundo os paleontólogos, a presença de hominídeos, no vasto espaço europeu, vindos de África, data de há cerca de 1,8 milhões de anos. No princípio, era o “homo erectus”, bípede, que, através da sua longa evolução, atingiu a espécie “homo sapiens”, o homem moderno. Segundo os mesmos investigadores, há cerca de 700.000 anos, a Europa já era habitada por diversas espécies humanas de caçadores e recolectores que utilizavam elaboradas técnicas para sobreviverem, sobretudo com caça, fabricando instrumentos de pedra funcionais e artísticos, como os bifaces “tidos hoje, como uma primeira emergência do pensamento estético”. Só que as mudanças climáticas e os períodos glaciares foram tornando-se os principais inimigos dos primeiros habitantes da Europa - chegados em várias vagas de África e médio-oriente-, obrigando-os a constantes deslocações.
Entre as várias populações aqui chegadas, há cerca de 400.000 mil anos, encontra-se uma subespécie do “homo sapiens”, o “ homo de neandertal” que era tão evoluído, que, além da sua arte na construção de instrumentos de caça, construía sepulturas, esculturas e até pinturas. Descoberto o fogo e a sua utilização nesta altura, as populações locais puderam alimentar-se melhor, com carne mais digestiva e menos tóxica. Por outro lado, o fogo iluminava os espaços habitacionais das grutas rochosas, onde se refugiava o “homo do neandertal”, afugentando os animais ferozes. À volta do fogo, terão nascido os mitos e o pensamento simbólico. Estes dois hominídeos, durante largos milénios, acabaram por conviver no espaço europeu, tendo o “homo do neandertal, por razões ainda difíceis de explicar, se extinguiu, há cerca de 30.000 anos a.C..
Nada leva crer que tenha havido entre estas duas espécies de hominídeos, massacres ou guerras, pela posse da terra. Pelo contrário, os historiadores falam-nos de uma aculturação, coabitação pacífica, trocas de técnicas e de cultura. Dotados de semelhantes capacidades cognitivas, simbólicas e espirituais, souberam conviver, enriquecendo-se mutuamente. Estas duas populações foram misturando os seus genes, numa longa mestiçagem, provada em análises pelo ADN. Negando-se a causa da sua extinção a um vírus ou a pestes, os especialistas inclinam-se por explicar o seu desaparecimento, pelo facto de ele se reproduzir menos do que o “homo sapiens”. Este, sendo mais fértil, pode revitalizar – se melhor, ao ponto de conseguir integrar, uma boa parte da outra espécie, cada vez mais anémica, demograficamente. O “homo sapiens”, pelo contrário, através de uniões mistas, tornaram-se dez vezes mais fecundos do que os “neandertais”. Teria sido normal, segundo opinião dos investigadores, que “as duas espécies, ao longo dos milhares de anos que coexistiram, se fossem misturando, com trocas genéticas, numa vasta massa de “ homo sapiens”. Dando-se a extinção do nosso familiar “neandertal”, a responsabilidade, pela conservação do nosso espaço, ficaria entregue à nossa espécie – homo sapiens - o homem atual. À luz dos estudos laboratoriais, podemos concluir que a nossa velha Europa, já foi berço de muitas espécies humanas que se foram integrando e desenvolvendo mutuamente. Hoje, Como pediu o novo cardeal A. Marto, em 17.06.18, “ não podemos deixar a história nas mãos de gente xenófoba”, mas tornar a nossa velha Europa um espaço aberto e multicultural. Façamos todos por isso.
florentinobeirao@hotmail.com

 

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