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Crónica: A Debita nostra CCXXXIV

Luís Costa - 02/05/2024 - 9:38

"A qualidade da democracia também é isto: fazer com que o máximo de votos conte. O que é cada vez mais claro é que o sistema eleitoral vigente precisa de ser melhorado sob pena de a democracia, que este ano celebra o seu quinquagésimo aniversário, não dar resposta a todos. Não é uma mudança que se faça em cima das eleições, é certo, mas é uma conversa tão antiga que se torna urgente.” (Sónia Sapage, PÚBLICO, Editorial, 20-03-2024).
Não é difícil de admitir que um dos grandes problemas com que as democracias representativas se debatem é exatamente o do cumprimento daquilo que se propõem e que é suposto caracterizá-las: a capacidade de representação.
E se isso se deve à crescente atomização das sociedades, ao esvaimento do seu sentido gregário e à consequente pulverização dos conjuntos de identificação política (partidos, mas não só), não me parece que tal se possa resolver por negação. Ou seja, por se ignorar: afunilando o processo de representação, impermeabilizando as suas desgastadas instituições e tentando canalizar o seu crescente Rossio para tradicionais ruas da Betesga.
Aí, as redes sociais, com a sua lógica do “salve-se quem puder” e menosprezo pela delegação política, levar-lhes-ão sempre a palma. A não ser que ‘alguém’ suficientemente versátil se apresente a federar o múltiplo descontentamento: de quem se sente mais instrumentalizado que ouvido, deserdado da pretensa influência e interesse pela política, engenhosamente excluído de todo e qualquer poder de decisão (DEBITA NOSTRA CCXXXIII).
Assim, o que importa, por mais que isso dessirva a quem se vê servido, é repensar o próprio sistema eleitoral. No que ele confirma de desdém pela representação política, nos seus clamorosos efeitos, no desperdício de votos que deveriam contar (1.166.263, dos quais 73 mil na Madeira, 19.944 em Viana do Castelo e 13.290 em Vila Real, etc.).
E, se os círculos da emigração (43% Europa; 39% fora da Europa) podem aqui ser considerados especiais, por particulares dificuldades de contacto, que dizer de Portalegre (40%), de Bragança (29%), Beja (28%), do interior, em geral, neste seu contributo para a desmesurada recusa, ‘à boca da urna’, de 19,5% de todos os votos válidos?!
Mas não só, já que o mais difícil é contabilizar a percentagem de “votos úteis” que se deve precisamente a toda a fuga ao ‘voto inútil’ que, deste modo, se não faz representar. No contexto de uma latente pressão, para que se adira à ‘normalidade’, que não é mais do que a que, agora sobranceiramente, obsta à melhoria do sistema de representação.  E em que se evidencia como, fora dos grandes círculos, é por demais significativa a manifesta preocupação dos eleitores por não votarem no partido em que querem (Sapage).
O que nos remete para questões como a da dimensão dos círculos e dispersão dos votos.

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