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Digressões Interiores: O perigo dos poços escondidos

José Lourenço Roque - 21/07/2016 - 8:00

Dei começo a esta crónica do mês de Julho poucos dias depois de ter sabido da grata notícia sobre a distinção conferida ao jornal “Reconquista”, considerado o melhor da imprensa regional.

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Dei começo a esta crónica do mês de Julho poucos dias depois de ter sabido da grata notícia sobre a distinção conferida ao jornal “Reconquista”, considerado o melhor da imprensa regional. Apresso-me, por isso, antes de dar forma aos meus costumados devaneios e arengas, a manifestar o meu regozijo e a dirigir a todos os que ali trabalham – em especial à equipa de jornalistas – uma palavra de muita estima e admiração. Graças ao seu labor, à sua competência e dedicação semanalmente nos aproximamos e descobrimos na cidade de Castelo Branco e nos multifacetados contornos e horizontes de toda a região. Aqui e por esse mundo além nas comunidades de emigrantes beirões. Lembrei-me da Cristina, pergunto por ela sempre que passo na rua de S. Miguel.

No palco da vida comunitária aldeã já me atribuíram grandes papéis e altas nomeações. A mais recente veio da prima Lourença que, ao prontificar-me para lhe pagar em Castelo Branco a fatura da água, logo se desunhou em agradecimentos e elogios pelo meu jeito de ajudar, acrescentando de modo bem claro e certeiro – como é seu timbre – que “a bem dizer, o primo faz de criado do povo”. Por estas e outras peças, não falta quem me censure e advirta: “Ai, se a sua mãezinha fosse viva…”. Por diversas razões, assentes na falta de espaço e oportunidades, o jornal “Reconquista”, que é do meu ano, demora meses (salvo na edição “online”) a publicar os meus textos. Daí que alguns leitores, que não sabem o que se passa nem frequentam a internet sejam levados a pensar que já estou fora do tempo ou que adormeci nos “braços da preguiça”. Ainda recentemente a Menina Inês, com quem viajei das Sarzedas para Castelo Branco, desabafou sem rodeios: ”Tem andado muito preguiçoso, mal me chega o jornal folheio e torno a folhear e não encontro nada seu…”. Apesar das demoras ou omissões, é bom escrever e sentir que há quem note a falta das minhas palavras. Gosto de pessoas que ainda “têm tempo para ter tempo…”. Trago hoje a terreiro um assunto muito sério que deveria merecer a atenção de todos e desencadear a intervenção das autarquias e de outras instâncias competentes. Um alerta sobre perigosas “ratoeiras” espalhadas pelo campo fora, ao redor ou longe das povoações. Trata-se dos inúmeros poços que outrora davam vida a milheirais, a vinhedos, a hortas e pomares e que agora, já sem quaisquer sinais de picotas ou de noras, escondidos ou disfarçados na vegetação selvagem, rentes ao chão, constituem autênticas armadilhas para pessoas e animais. Hoje em dia e mais ainda daqui amanhã, quem se desorientar ou aventurar (à caça, em passeio, em missões técnicas ou científicas) por esses vales completamente abandonados corre sérios riscos de desaparecer sem deixar rasto, sepultado nesses abismos tremendos. Tragédias à espreita; casos de polícia, pendentes ou arquivados. Eu próprio, ainda há pouco tempo, só por um triz me livrei de cair num desses precipícios medonhos, fundo e estreito, rodeado de ervas e estevas, no Ribeiro das Teixugueiras. Embora haja pessoas que dão bons exemplos – eu mesmo já mandei arrasar um dos poços que tinha no Vale dos Cavalos – a grande maioria dos proprietários ou herdeiros só cuidam de ganâncias imediatas e nada se incomodam a tal respeito. Espero que este aviso não caia em saco roto e que quem de direito assuma urgentemente as responsabilidades e as iniciativas indispensáveis à resolução deste gravíssimo problema que passará pela devida sinalização ou mais ainda pelo aterramento de tais poços, minas e represas.

Afasto-me dos vales que metem dó – esterilizados e armadilhados – e regresso às lombas e outeiros donde se avistam os nossos rios e ribeiras, os nossos povoados, a nossa vila, a nossa cidade. No dia 21 de maio visitei a feira medieval das Sarzedas, cheia de sabores, fantasias e tentações. Ao terceiro ano, atingiu já foros de grande evento e de cartaz turístico, dentro e fora de portas, graças ao engenho e à energia da nossa querida Presidente, Dr.ª Celeste Rodrigues. Por má fortuna minha, perdi-me na multidão ou na “máquina do tempo” e não encontrei quem mais desejava encontrar. Amanhã vou a Castelo Branco. Hei de lembrar-me de ti ao passar no chafariz da Granja ou na avenida do Liceu. Talvez nos encontremos nas muralhas da cidade ou na esplanada das tílias… Mesmo que não perguntes, talvez te conte o destino das rosas que levo para Coimbra. Nunca mais ouvi a tua voz nem me chegou carta tua… Talvez me digas as palavras em que te escondes ou a praia em que me esperas.

COMENTÁRIOS

Maria Beatriz
à muito tempo atrás
Espero que seja uma crítica leve, cordata, tendo em conta o teor desta crónica que muito apreciei. Tem razão o Dr. quando critica o desmazelo dos seus vizinhos perante o perigo dos poços, espalhados nas suas terras ,inactivos e escondidos. Bem traçado a reflexão sobre as suas amigas e da sua amada. A manta sentimental cobre a crónica e dá um tom pessoal. Linda de se ler....