Este site utiliza cookies. Ao continuar a navegar no nosso website está a consentir a utilização de cookies. Saiba mais

Leitores: Os pequenos ditadores

Hélder Henriques - 22/02/2024 - 9:53

O dia 25 de Abril de 1974 constituiu, inegavelmente, um virar de página.

Partilhar:

O dia 25 de Abril de 1974 constituiu, inegavelmente, um virar de página. Encerrou-se um período da História de Portugal contemporânea marcado por uma ditadura feroz, com uma polícia política espalhada pelo país, uma guerra colonial cujos soldados tiveram de deixar as suas famílias para ir ao encontro do desconhecido, um tempo onde a liberdade de imprensa e de opinião eram controladas de “lápis azul” em punho, onde os costumes eram vigiados, onde o analfabetismo reinava e a escola era “a oficina das almas”, onde os índices de mortalidade, particularmente a infantil, eram preocupantes, uma edificação assente nos fundamentos ideológicos construídos, entre outros, por António de Oliveira Salazar. 
Esse é o tempo que não pode, em jeito de revivalismo, regressar. A sombra que parece estar a ganhar adeptos revela preocupação e a nossa Democracia, através dos partidos que defendem a liberdade, e que lutaram por ela, têm a especial responsabilidade de travar este “regresso ideológico ao passado”. Exige-se atenção ao que envolve a sociedade portuguesa, e também as nossas comunidades territoriais, no que aos extremismos diz respeito.   
Abril representa uma conquista que se iniciou mesmo antes da própria Revolução de 25 de Abril de 1974. Abril não é, nem foi, uma circunstância particular. Abril incorporou também as tentativas aparentemente pouco frutíferas de mudar a situação mesmo antes de Abril de 1974. Abril, foi construído pelos soldados, mas também pelos homens e mulheres que se atreveram a apoiar a candidatura presidencial de Humberto Delgado ou pelas acesas lutas dos estudantes universitários que com a sua capa e batina “pediram a palavra”. 
Para se chegar a Abril foi preciso plantar uma semente no silêncio da noite escura que o País viveu durante quase cinco décadas.    
Com Abril, a semente tornou-se flor! Abril instituiu uma Constituição que continua a ser garantia dos nossos direitos e deveres. Abril permitiu a abertura de Portugal ao mundo, o exercício de uma cidadania plena, com um Serviço Nacional de Saúde que os portugueses nunca tinham experimentado e uma educação democrática que valorizou o pensamento critico e permitiu a mobilidade social. Abril, insistiu na igualdade e no acesso de todos os portugueses aos diferentes serviços públicos. Abril colocou-nos na Europa, o que permitiu recuperar gradualmente a nossa desvantagem económica, social e até de respeitabilidade política. 
Abril, representou a abertura de uma janela de esperança e de oportunidade para as novas gerações. 
Porém, a flor, entretanto mais forte e resiliente, que cinquenta anos depois continuamos a celebrar encontra-se ameaçada pelos extremismos políticos. Nós, “filhos de Abril” não podemos permitir que as liberdades que Abril nos proporcionou sejam, de modo algum, colocadas em causa. Se outrora essa liberdade era condicionada através dos instrumentos do Estado, hoje a liberdade é condicionada por outros protagonistas que designamos de “pequenos ditadores”. 
Os pequenos ditadores representam a insegurança do seu próprio ego, são aqueles sorridentes pela frente, mas que se vingam na primeira hora, aqueles que enchem a boca com a democracia, fazendo uso dela para os fins convenientes, mas que nas atitudes diárias pedem “sangue”, como se de vampiros se tratassem. 
Aos “pequenos ditadores” que potenciam os extremismos políticos devemos, enquanto “filhos de Abril” mostrar que não condicionam, nem podem condicionar, aqueles que, de algum modo, se relacionam com eles, que trabalham em proximidade, que habitam na mesma casa ou que estudam no mesmo espaço. Não há margem de manobra, nem mesmo tolerância, para quem ousa “utilizar” Abril em nome de qualquer coisa que não seja a Liberdade, a Igualdade, a Saúde, a Educação, a Habitação, entre tantos outros princípios e áreas que podíamos destacar.  
Os pequenos ditadores são aqueles que julgam que o mundo deixará de girar se saírem de cena. Sim, porque vão sair de cena! Todos saímos de cena! Os “pequenos ditadores” são aquelas “figurinhas” aparentemente humildes e tristes, que de vez em quando, como se tratasse de uma bênção do tempo da outra senhora, nos tentam bater com a mão nas costas, como se o povo não soubesse ler os sinais. 
Os pequenos ditadores são personagens que tentam alterar a vida do cidadão através de um telefonema ameaçador, de uma tentativa de condicionar a escrita de um texto ou de chamar a atenção para uma conversa com um amigo que, na opinião desse pequeno ditador, não se pode ter. No século XXI não é tolerável que os resquícios desse tempo que Abril procurou encerrar continuem vivos e presentes numa sociedade como aquela que queremos continuar a edificar.
Os “filhos de abril” têm o dever de combater as desigualdades, as injustiças sociais, promover o progresso económico, defender uma justiça célere, estar ao lado das políticas públicas que promovam a igualdade de direitos e acesso aos serviços, defender a Escola Pública, denunciar o medo e a chantagem, dar opinião quando se sente que deve contribuir para o debate, mesmo que outros – os tais pequenos ditadores - não a queiram escutar porque é incómoda. 
Os “filhos de abril” são hoje os soldados de outrora que têm por missão continuar a construir Abril e a defender as liberdades, direitos e garantias conquistadas ao longo dos últimos 50 anos. 
Pela Democracia, pela Liberdade, por Abril!

 

COMENTÁRIOS

Álvaro
Mês passado
Discurso de empregado estado. Nao quer perder o tacho.