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Só a solidariedade trata desta ferida

Florentino Beirão - 31/03/2022 - 9:08

Nos tempos que vivemos, com a pandemia ainda viva e os efeitos nefastos da guerra, provocada pela invasão da Rússia à Ucrânia, não há palavra mais salivada do que solidariedade. Sobretudo, quando nos referimos a cerca de dois milhões de ucranianos que, de mala na mão, tiveram que fugir das suas habitações confortáveis, rumo ao desconhecido. Filas e filas de crianças, raparigas jovens e gente mais velha, enchem comboios onde habita um vazio de sentimentos e montanhas de incerteza quanto às suas vidas truncadas pela guerra que tem deixado as cidades vazias e habitações desventradas. As imagens que nos chegam deixam-nos o coração destroçado, face a esta guerra, acompanhada em direto diariamente. Um conflito sangrento, atroz e sem sentido, provocado pela avidez de um Putin autocrata, imperialista e insensível, face ao sofrimento alheio. 
Se já a pandemia nos cortava o coração com números diários de mortos, agora temos que recolher milhões os desalojados ucranianos a correr com as suas crianças pela mão, rumo ao desconhecido.
Face a toda esta conjuntura de sangue e lágrimas, a palavra solidariedade ganha mais força e pertinência. Felizmente, muito são já os exemplos de tantos, sobretudo de artistas jovens, que já se encontram a praticar esta palavra de ouro. Ser solidário para com os refugiados da Ucrânia impõe-se hoje a todos nós que guardamos nos nossos corações e praticamos com as nossas mãos pequenos gestos que vão alimentar a vida de tanta gente sofredora que todos os dias fogem do seu país, para salvarem as suas vidas, deixando para trás, todo o conforto que as suas cacas lhes ofereciam. Recordemos os nossos irmãos que há poucos anos viveram a mesma experiência, quando tiveram também de deixar os seus bens nas nossas antigas colónias em África. Serão muitos os que hoje assistem a esta debandada ucraniana, revivendo a sua dolorosa experiência, ainda bem viva.
Valeu também a estas pessoas a solidariedade do nosso país, sobretudo dos seus familiares que os receberam de braços abertos, com toda a generosidade deste mundo.
Por todas estas considerações, mais viva tem de ser em nós a vontade de ajudarmos tantos que nada mais trazem do seu país a roupa que vestem. Louvado seja o gesto da diocese de Portalegre - Castelo Branco, na pessoa do seu bispo D. Antonino que colocou à disposição dos governantes algumas casas diocesanas onde vão ser albergadas mais de uma centena de famílias ucranianas.
Mas esta responsabilidade solidária não só deve mobilizar as instituições da Igreja e do Estado, como cada um de nós. Ninguém pode ficar para traz porque esta hora é de solidariedade para os que nos batem à porta, à procura de uma mão amiga que lhes dê o pão e o carinho que todo o ser humano merece.
A cada um a responsabilidade de ser solidário, face às prementes necessidades dos outros.
Hoje, são eles, mas amanhã, não sabemos o que nos espera num mundo tão complexo e cruel. O ímpeto inato de sermos solidários deve ser o antídoto face a este mundo natural a ser destruído em nome do imperialismo e do lucro.
Mas a solidariedade para com os ucranianos não nos deve levar a esquecer dos cerca de 20% dos portugueses que vivem hoje em situação de pobreza.Com uma classe média a desaparecer e os muito ricos a medrarem, por vezes com a corrupção, o nosso país encontra-se numa situação explosiva, socialmente falando. Como sabemos, mais 230 mil portugueses vivem na pobreza, nomeadamente, fruto da pandemia. Entre estas pessoas, as mulheres foram as mais prejudicadas, a par dos desempregados e das famílias monoparentais, com crianças: uma em cada três é pobre.
No ano passado, o primeiro da pandemia 1,9 milhões de portugueses em situação de pobreza, isto é, obrigados a viver com menos de 554 euros, encontrava-se nesta deprimente condição.
Recorde-se que o INE, em 2020, ano que consubstancia o retrato das condições de vida pós- pandemia, mostra que 18, 4% dos portugueses estavam abaixo da linha de pobreza, mais 2,2 pontos percentuais do que no ano anterior. São mais 228 mil pessoas atiradas para a pobreza. Com os preços a subir diariamente, da gasolina ao pão, o futuro não se mostra risonho. 
Hoje, ser solidário é responder às múltiplas necessidades do nosso tempo.

 florentinobeirao@hotmail.com

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