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Cata-Ventos: E as alterações climáticas?

Costa Alves - 05/05/2022 - 10:00

Em 30 de março de 2022, o valor da concentração de dióxido de carbono registado na estação de referência de Mauna Loa, no Havai, foi de 420,1 partes por milhão (ppm), mais 3,1 do que no mesmo dia do ano passado. Isto é, as emissões de gases com efeito atmosférico de estufa, em vez de diminuírem drasticamente, continuam a aumentar a um ritmo superior ao verificado entre 1970 e 2000 (aumento médio anual de 1,5 ppm) e, entre 2001 e 2007 (2 ppm). A subida para valores de aumento anual em torno de 3 ppm é alarmante a todos os títulos. O acordo de Paris entrou em vigor em 2020 e não garantiu a efetividade de um quadro de redução das emissões que produzem o aquecimento global.
A manter-se este nível de aumento anual, o limite crítico de 450 ppm será atingido daqui a 10 anos. A esse limite crítico corresponderá um aumento de 2º C da temperatura média global relativamente ao início da revolução industrial.
A partir desse limite, o funcionamento da atmosfera atingirá configurações estabilizadas diferentes das que determinaram o clima em vigor até aos anos 1980. Por agora, encontramo-nos numa fase de transição que se carateriza por grande variabilidade do comportamento dos invernos (com médias mais altas das temperaturas mínimas), variação incomum da distribuição e quantidade da precipitação e consequente aumento da frequência e duração das ocorrências de seca e precipitação muito intensa. Também se verifica um aumento da frequência e intensidade das ondas de calor que causam efeitos severos na saúde humana (com excedentes de mortalidade e incremento da morbilidade), nas florestas e na restante biosfera, sobretudo, mas não só, no verão. E, como é caraterístico dos climas de tipo mediterrânico, quando as épocas chuvosas falham, como aconteceu este ano, as primaveras e outonos raramente contribuem eficazmente para uma recuperação do padrão da precipitação.
A fase atual de reordenamento das zonas de influência geopolítica, iniciada com a invasão da Ucrânia, torna ainda mais precária a possibilidade aberta pelo acordo de Paris (apesar de tardio e insatisfatório) de alterar o quadro das emissões de gases com efeito de estufa. Depois da pandemia e, agora, com as transformações geradas pela guerra, prevê-se que as políticas de progressiva, mas muito parcial, descarbonização das atividades humanas fiquem muito danificadas. A reconfiguração das relações entre estados deverá produzir alterações profundas nas formas de exploração, distribuição e gestão dos recursos energéticos, sobretudo nos de origem fóssil. Mas não só; o electronuclear, em maré baixa após Fukuchima, ressurge como uma necessidade em países que pararam o funcionamento de muitas centrais nucleares ou começaram a desmantelá-las. E não consideram, sequer, a persistência dos riscos de acidentes nem que os resíduos radioativos ficarão, como se fosse tolerável, centenas e milhares de anos à guarda das inumeráveis e inocentes futuras gerações.
Não sei se esta guerra é, também, uma guerra com determinantes geoestratégicas da exploração e distribuição dos recursos de combustíveis fósseis. Pelo menos, tem efeitos de inversão de caminhos à escala global que se repercutem negativamente na composição da atmosfera.
O esforço de concertação global, mesmo com grandes lacunas, está paralisado ou desencaminhado; portanto, cada vez mais atrasado. A ultrapassagem dos limites que determinam as alterações no comportamento do nosso sistema climático está agora ainda mais no horizonte.
mcosta.alves@gmail.com

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