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A milenar devoção a Santiago de Compostela (2): As raízes de uma longa história

Florentino Beirão - 05/08/2021 - 9:25

Num anterior artigo, relativo à devoção a Santiago de Compostela, avançámos algumas pistas, relativas à peregrinação a Santiago de Compostela na Galiza, para quem se disponha a aventurar-se à concretizar este tentador desafio.
Desta vez, embora sucintamente, vamos revisitar a fascinante História desta devoção, com os seus momentos de esplendor ou de decadência, inerentes a todas as vicissitudes de todas as instituições. 
A devoção a Santiago de Compostela terá surgido a partir de uma antiga lenda, com raízes no séc. IX, segundo a qual se acreditava piamente que um eremita, de nome Pelágio, teria sido contemplado por uma visão celeste. Segundo esta, encontrava-se num determinado lugar – o viria a ser a cidade de Compostela - um sepulcro com três corpos. O Bispo diocesano, avisado pelo eremita, também quis deslocar-se aquele lugar para tentar identificar ele próprio os referidos cadáveres. Segundo a tradição, estes restos mortais foram identificados como pertencendo ao Apóstolo Santigo e a dois dos seus discípulos que teriam também vindo com ele de Jerusalém, onde terá ocorrido o seu martírio, infligido pelos romanos. Também convertido a esta crença, o Bispo de Compostela logo mandou erguer ali uma pequena ermida para acolher os primeiros peregrinos que tinham começado a ser tocados por esta devoção. Mais tarde, acabaria por ali ser erguida uma igreja maior, entregue a religiosos e, finalmente, uma magnífica catedral de estilo barroco.
Como sabemos, na idade - média e não só, muitos movimentos religiosos acabaram por ser apropriados pelos poderes políticos que os foram manobrando, em proveito próprio. Foi o que também aconteceu com o Rei Afonso II das Astúrias (759-842) o qual se encontrava empenhado em tornar mais coeso e forte o seu poder real, tentando assumir o lugar de legítimo representante da tradição cristã visigótica que dominou a Península Ibérica.
Nesta a conjuntura de Reconquista Cristã da Península aos Mouros, todo este movimento religioso de uma santa cruzada, foi sendo aproveitado por este monarca para unir os cristãos contra os adoradores de Alá, invocando a proteção de Santiago - Cavaleiro, como “mata-mouros”. Este fervor político-religioso acabou por dar origem à Ordem Militar de Santiago que tanto viria a apoiar os primeiros reis de Portugal na Reconquista do território aos mouros, sobretudo a sul do país. Recorde-se que na idade - média, no tempo das Cruzadas, havia dois grandes polos para onde convergiam as peregrinações dos fiéis. Os lugares Santos de Jerusalém e a sede papal em Roma. Quando apareceu e se desenvolveu a devoção a Santiago de Compostela, como se tornava mais fácil fazer a peregrinação a este lugar, para se obter a indulgência plenária, para remissão dos pecados - daqui os Anos Jubilares - peregrinos de toda a Península Ibérica, de França, de Inglaterra e até de Alemanha, optaram por escolher Compostela, por lhes ser mais acessível. Deste modo, este espaço religioso acabaria por competir com Roma, sede do Papa e com Jerusalém, na posse dos mouros.
A partir desta altura, a catedral de Santiago tornou-se um espaço sagrado de tanta importância que, do séc. X ao XV, os Reis de Leão e da Galiza o escolheram para fazerem neste lugar a cerimónia da sua coroação real. Graças a esta importante centralidade político-religiosa, Compostela foi crescendo de tal modo no seu prestígio e nas suas riquezas que acabou por ser cobiçada pelos povos invasores Normandos em 969. Perante este perigo, o Bispo Sisenando II teve de puxar os cordões à bolsa, para amuralhar a cidade.
Se conseguiu ir resistindo ao povo normando, tempos depois, Compostela viria a ser vencida em 997, agora elo chefe militar muçulmano Almançor que, através de um ataque fulminante o qual causou graves danos à cidade. Foi preciso esperar pelo século seguinte, com o avanço da Reconquista Cristã, a partir das Astúrias, para que de novo Compostela se tornasse a erguer de novo, continuando a receber novas peregrinações de devotos.
A partir do séc. XII, com a cidade novamente nas mãos dos cristãos, as peregrinações foram reativadas em 1120 pelo Bispo Diego que obteve do Papa a transferência da sede Metropolitana de Mérida, para Santiago de Compostela. Esta mudança só foi possível, porque Mérida se encontrava nas mãos dos muçulmanos, com a sua capital em Granada. Deste modo, Santiago de Compostela deu mais um salto na sua importância, emancipando-se da de Braga.
florentinobeirao@hotmail.com

 

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