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A escolha de um futuro

Luís Beato Nunes - 14/06/2018 - 9:39

Apesar dos conselhos e dos exemplos do passado, nem sempre somos conscientes do impacto que as decisões presentes têm no nosso futuro. Por vezes, essas consequências até são ponderadas, mas como já não estaremos vivos, acabamos por não as valorizar como devíamos.
Os pais de hoje serão os avós de amanhã e, possivelmente, os bisavós do dia seguinte, mas como este último ainda está longe, dificilmente as suas decisões presentes estão definidas num horizonte temporal que inclua as gerações a seguir aos seus netos.
Esta negligência acaba por ser compreensível, porque, apesar da nossa racionalidade e de conseguirmos projetar no futuro os nossos atos presentes, esta projeção ainda se limita muito ao nosso horizonte de vida.
Contudo, desde a segunda metade do século passado que o cenário demográfico se está a alterar. A esperança média de vida aumentou mais de 30 anos em todos os países da OCDE desde 1940 e, com esta alteração, também a nossa responsabilidade para com as gerações futuras se tornou mais premente.
Atualmente, em países como o Japão, cerca de 30% da população tem mais 60 anos, tendo ainda bem presentes as memórias do esforço de reconstrução durante décadas após a beligerância do final da primeira metade do século passado.
Na Europa, as mesmas memórias também permanecem, assim como alguns rancores e desconfianças. Porém, essas desconfianças não foram suficientes para impedir um futuro de cooperação e solidariedade, sempre desafiante.
Em Portugal, a geração que lutou pela democracia também se lembra da cultura de subserviência e servilismo em que cresceu e que tão arduamente tentou combater nas últimas décadas.
Por vezes, a memória não é suficiente para evitar os mesmos erros, assim como a criação de pirâmides de caciquismos que alimentam “senhores” com nomes diferentes dos do passado, mas com os mesmos comportamentos.
A cristalização de hábitos sociais de reverência pela simples reverência pode salvar o nosso presente, evitando conflitos com os “senhores”, mas não proporcionará às gerações futuras a liberdade que a maioria não tem no presente.
Num mundo onde podemos esperar viver quase até aos cem anos, a responsabilidade do país que queremos para o futuro está nas decisões que tomamos no presente.
E seguramente que as gerações futuras nos julgarão não como morreremos, mas como vivemos e decidimos combater uma teia de interesses e influências cujo único fim é a sua própria sobrevivência.
Num país onde o desemprego jovem continua acima dos 20%, o futuro não pode continuar condicionado pelos caciques e pelos “favores”, até porque a nova geração está a descobrir um mercado mundial onde a sua perseverança e criatividade são valorizadas.
Nas próximas décadas arriscamo-nos a ser um país de memórias se não lutarmos por uma sociedade descomplexada e com indivíduos libertos de “favores” que comprometem a forma como as gerações futuras encararão as suas vidas.
Não é tarde para reconhecer que muitas das expetativas que tínhamos não foram ainda realizadas, e é tempo de deixarmos um melhor juízo para os que nos seguirão, melhorando uma democracia que, em muitos aspetos, acabou por replicar a prepotência de interesses não sufragados em detrimento da defesa dos mais fracos.  

luis.beato.nunes@gmail.com

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