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Leitores: Castelo Branco. A bela adormecida...

Rui Amaro Alves - 28/12/2023 - 9:44

A cidade de Castelo Branco vive um torpor que tornar-se-á num sono profundo do qual dificilmente conseguirá sair.

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A cidade de Castelo Branco vive um torpor que tornar-se-á num sono profundo do qual dificilmente conseguirá sair. Um dia perde isto, outro dia perde aquilo; um dia cai uma coisa, no dia seguinte cai outra. Um dia vem um membro do governo carregado de promessas e de projetos. No dia seguinte vai embora e as promessas e os projetos caem em vão ou voltam com ele. Um dia o carreiro passa por ali e no dia seguinte passa por acolá. Os comboios passam por aqui todos os dias e pouca coisa deixam e pouca coisa levam. Pouca coisa se levanta. Mesmo muito poucochinho. 
De vez em quando, sendo cada vez mais corrente e habitual, é fixado um placar ou um edital. Vem aí um evento. Para nos lembrar que ainda temos vida. Aqui e ali, lá se ouvem umas notas de um piano, de um acordeão ou concertina, ou de um violino; umas vozes que cantam a solidão, a ficção e a ilusão. 
Como sempre, o carreiro das formigas segue de forma ordeira e organizada os laivos da seiva que este modo de viver, este regabofe,  as habituou. Farra e mais farra porque senão o vinho estraga-se e as moedas na bolsa apanham bolor. Acaba-se o evento e os carros com as moedas saem da cidade; têm outro destino. E o que fica? Fica o que os outros cantaram; a solidão, a ficção e a ilusão. Uma barriga cheia de nada. A ressaca da farra.   
Este  entorpecimento profundo, este modo de vida e esta pandegaria já nos acompanham há vários anos e teimam em permanecer. Que fada madrasta, que bruxa, nos fizeram mal? Que víbora nos picou e inoculou tal efeito dormente? Não há forma de perceber e muito menos de resolver este enigma.
O que se passou recentemente com a Estratégia Local de Habitação é um exemplo claro, entre muitos outros, desta dormência que se abateu sobre a cidade há já vários anos. 
A Nova Geração de Políticas de Habitação foi criada pelo governo no ano de 2017. Foram muitos os municípios que criaram a sua Estratégia  Local de habitação para obter fundos comunitários. Em 2023 são já muitos os municípios que vão na segunda versão da Estratégia Local de habitação para aceder aos fundos do Plano de Recuperação e Resiliência. Há dias, a Câmara Municipal de Castelo Branco (CMCB) elaborou a sua primeira estratégia. Durante 5 anos esteve  a dormir sobre o assunto. 
Para a CMCB a questão da habitação e os problemas de habitação no concelho  são um mal menor, sem importância e qualquer relevância política e social. A estratégia que apresentaram à Assembleia Municipal é  poucacinha; não aborda de forma séria os problemas e, como vem sendo hábito, também não os resolve. 
Não há frases nem papel que cheguem para revelar esta dormência, entre outras coisas. Falaremos apenas aqui de alguns. 
Para a CMCB  a habitação é uma coisa e o urbanismo e desenvolvimento urbano é outra, como se fossem dois problemas completamente diferentes. Mas não são, como refere a Lei de Bases da Habitação. A CMCB ignora e, no fundo, vai mesmo contra alguns princípios desta lei aprovada em 2018 (Lei nº 83/2018). Tem uma visão muito redutora da função social da habitação. Ignora deliberadamente os planos urbanísticos que são um instrumento poderoso das políticas locais de habitação. Ignora os recursos e terrenos de que dispõe nos planos (não sabe nem quantos nem quais nem onde eles estão), não os mobiliza, não combate a especulação imobiliária e, ao invés, promove-a, não olha para os outros setores da oferta de habitação, esquece as misericórdias, as freguesias, a igreja, etc.   
Não dá qualquer importância ao mercado de habitação. Deixa de fora os problemas sérios com que os jovens e as famílias se confrontam para aceder ao mercado de aquisição e de arrendamento. Estamos a falar daqueles jovens  e famílias que não sendo pobres, de acordo com a lei, e não podendo, por isso, aceder ao mercado social da habitação, não reúnem condições  para ser ajudados, mas também não dispõem de recursos e de rendimentos para irem ao mercado resolver o seu problema habitacional. Por isso, continuam com ele.
Em 2019 a CMCB vendeu 7 lotes na Quinta da Granja  para a construção de 70 fogos. O preço médio do terreno por cada fogo rondou os 30 mil euros. Estes lotes já foram construídos? Não podem ou não poderiam servir para resolver problemas de habitação destas famílias? Claro que sim. Mas a CMCB não quis nem quer. Em 2023, na Estratégia Local de Habitação a CMCB diz que vai adquirir terrenos para construir fogos. Alguém consegue perceber isto? Vende a “este” e vai comprar “àquele” uma coisa que já vendeu.
Segundo a CMCB só há problemas habitacionais em Castelo Branco (vários), Alcains (um), Freixial do Campo (um), Salgueiro do Campo (um), Póvoa de Rio de Moinhos (um) e Monforte da Beira (um). Esquece deliberadamente os milhares de idosos a residir no concelho, alguns a residir em suas casas, algumas delas a necessitar de  pequenas adaptações para lhes promover a segurança e conforto necessários. 
A Estratégia diz que há 70 alojamentos privados para intervir em todo concelho e estima que são necessários mais de 3 milhões e 500 mil euros em obras. Mas não diz de onde vem o dinheiro e quanto pagam os privados ou se é a CMCB que paga estas obras. A obra no Freixial esta estimada em 120 mil euros. A obra na Póvoa em 60 mil euros. A obra de Monforte em 30 mil euros. No Salgueiro em 51 mil euros. Em Castelo Branco os valores oscilam entre os 20 mil e 75 mil euros.
A CMCB diz que é proprietária de 229 fogos no concelho em alguns bairros da cidade, 4 dos quais não estão ocupados. Porquê? É proprietária de mais  77 fogos dispersos pela cidade Não se sabe se são mais ou não. Em lado algum é dito. Depois, diz que 113 fogos se encontram com muito graves problemas, 6 com graves problemas e 1 com médios problemas.  Isto quer dizer que mais de metade dos fogos (113) apresentam graves problemas e que as  famílias que neles residem vivem em condições indignas. Há quanto tempo? Só agora é que se lembraram disto. Desde 2017 que foi aprovada a legislação que permite obter financiamento para resolver estes problemas.  
Mas, mesmo assim, mais vale tarde que nunca.  Por isso,  o representante do Movimento Castelo Branco Merece Mais na Assembleia Municipal, o Prof. Ernesto Candeias, só poderia votar em branco. Em branco, porque não poderia votar contra  para não prejudicar ainda mais aqueles que já tinham sido e estão a ser prejudicados por o município de Castelo Branco não ter Estratégia Local de Habitação.  

 

COMENTÁRIOS

JMarques
No ano passado
Marasmo total!