Só pode. A única explicação que descubro para o que relato a seguir, é os políticos que mandam na nossa cidade não terem filhos ou já não terem filhos adolescentes ou jovens.
Todas as mães e pais de Castelo Branco, sabem, há décadas, que existe em Castelo Branco uma enorme condescendência para com o escândalo da venda de tabaco e álcool a menores de idade. Todos ouvimos jovens de dezasseis, treze ou mesmo doze anos contarem como foram à discoteca no fim-de-semana onde beberam vários shots de álcoois pesados e até absinto. Bastava passar pelas portas dos bares ou discotecas abertos até às duas, três ou mesmo seis da manhã para ver raparigas e rapazes com muito menos de dezoito anos com copos de bebidas alcoólicas na mão. Na rua do Relógio é, por vezes, muito difícil passar em noites de fins-de-semana, dada a quantidade de menores que fizeram dessa rua o seu ponto de abastecimento de álcool.
Tudo isto é ilegal mas, como se sabe, as leis neste país são para cumprir com calma e esquecer quando convém. À conta disso todos os anos ouvimos histórias de menores atendidos no hospital em coma alcoólico.
Se isto já era preocupante, o que fui ouvindo de relatos diversos nos últimos meses é bastante mais assustador.
Como o Expresso noticiou em dois artigos recentes, o tráfico e o consumo de droga em Portugal dispararam nos últimos dois anos. Os artigos salientam o papel de Portugal como porta de entrada da droga sul americana e africana para a Europa, mas quase ignoram o papel dos pontos de passagem da mesma droga no interior do país. Há décadas que qualquer estudante do secundário de Castelo Branco, já não falando do Politécnico, sabe que pode obter a quantidade que quiser de qualquer variedade de drogas ou pastilhas, desde que tenha dinheiro. São conhecidos numerosos casos de rapazes e raparigas com vidas promissoras completamente arruinadas pela facilidade com que os traficantes lhes põem nas mãos drogas, das leves às pesadas. Mas as histórias que fui ouvindo de jovens de treze aos dezasseis anos a consumirem haxe ou “erva”, a passarem rapidamente para a coca e a fazê-lo quase em frente de toda a gente, são assustadoras. Mais assustadoras são as histórias de miúdos de dezoito, dezassete e dezasseis anos que traficam tudo isto, até á porta das escolas, sendo conhecido um com dezassete que é já um traficante estabelecido com capital e meios que sugerem um futuro próspero no negócio. Já não estamos a falar de álcool mas de hábitos e viciações muito mais difíceis de abandonar e muito mais destrutivos de vidas e carreiras.
Se eu que pouco saio e não frequento a “noite” sei tudo isto, é de supor que a Policial Municipal, a PSP, a GNR, o Tribunal, a Junta de Freguesia e a Câmara Municípal têm a obrigação de saberem muito mais. É mais um caso parecido com o do receptador de material roubado que se desloca com um grupo de ciganos aos locais onde roubam, que as autoridades conhecem perfeitamente e que continua alegre e abertamente a tratar dos seus “negócios”. Suponho que não estamos ainda numa situação como a referida no caso do Expresso, em que dois inspectores da PJ trabalhavam para o cartel Papi da Colômbia, mas que há demasiada tolerância, há.
Com o fim do Governo Civil deixou de existir uma instituição que pudesse coordenar a luta contra este desastre anunciado. É assim natural que nos viremos para a Câmara, única entidade capaz de reunir e chamar a atenção das autoridades envolvidas.
A Câmara tem assim dois caminhos:
Ou ataca o mal pela raiz, exigindo o cumprimento das leis existentes e garantindo o controle regular do funcionamento legal dos bares e discotecas.
Ou decide manter-se impávida e fingir que nada tem a ver com o assunto. Nesse caso, sugiro que aproveite a onda e use as infra-estruturas existentes na cidade para ajudar os traficantes e os drogados: promove a plantação de “erva” nas hortas do Chinco, abre um curso de empreendedorismo para jovens traficantes na incubadora de empresas, põe o CATAA a identificar as variedades de drogas mais puras, faz um curso pós-alucinatório na Fábrica da Criatividade, oficializa a área de fumação e chuto que já há no Barrocal e calendariza uma feira local da droga, algures entre a do feijão frade e a das papas de carolo. Pensando melhor, pode mesmo criar o domingo das drogas, uma semana depois do das velharias. E porque não, subsidiar um desconto na “bolota” e no “pólen” para os turistas que utilizem o comboio cultural?
Como disse no princípio, para quem não tem filhos ou já os tem fora de cá, até pode correr bem.
Para quem cá tem filhos adolescentes ou jovens é melhor começar a pensar em mudar de cidade.