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Cata-Ventos: Emissões continuam a aumentar

Costa Alves - 02/11/2023 - 9:47

O valor médio da concentração de CO2 no mês de maio deste ano, registado no observatório de referência mundial, situado em Mauna Loa, no Hawai, foi 424 partes por milhão (ppm) em volume de ar. Um ano antes, também em maio, atingira 421. É o valor máximo do ano pois decresce até setembro e, por consequência, o valor médio de 2023 tende para se perfilar próximo de 420 ppm que será o valor mais alto atingido nos últimos 800 mil anos em que a concentração de CO2 ficou sistematicamente abaixo de 280 ppm - valor no início da Revolução Industrial.
Em 1950, a concentração de CO2 na atmosfera chegou a 300 ppm e, em 1987, já havia atingido 350 - valor máximo recomendado pela Ciência para evitar efeitos irreversíveis do aquecimento global. Em 2015, quando foi aprovado o Acordo de Paris, a concentração de CO2 ultrapassava 400 ppm e as emissões de gases com efeito atmosférico de estufa continuaram a ter incrementos anuais superiores a 2 ppm. Recordo que o Acordo impunha uma redução drástica das emissões até ao ano de 2030, de modo a impedir que a temperatura média global suba mais do que 1,5º C acima do valor da época pré-industrial.
Apesar das medidas de transição energética visando descarbonizar muitas atividades, em vez da necessária diminuição das emissões, o incremento das emissões continua entre 2 e 3 ppm por ano. Estima-se que o nível de aumento da temperatura média global de 2º C será atingido quando a concentração de gases com efeito de estufa alcançar 450 ppm. Se se mantiverem incrementos anuais acima de 2 ppm (não há nenhuma garantia de que haja decréscimo; pelo contrário), em menos de quinze anos atingiremos o nível crítico de aumento da temperatura média global.
Ouvimos os apelos dramáticos, várias vezes repetidos, do Secretário-Geral da ONU, António Guterres, e os decisores da Comunidade Internacional continuam tão surdos como dizem ser os ouvidos de mercador - e há mercadores e mercadorias nesta poderosíssima economia dos combustíveis fósseis. Para mais, esta fase de guerras e de conflitos que também incluem o reordenamento do poder em zonas de influência geopolítica, em que os combustíveis fósseis são determinantes, torna ainda mais precárias as tentativas de alterar o quadro das emissões de gases com efeito de estufa.
A partir do limite de 450 ppm, o funcionamento da atmosfera conhecerá configurações sinóticas diferentes das que determinaram o clima até aos anos de 1980. Por enquanto, estamos numa fase de transição que já se manifesta com efeitos severos e catastróficos de fenómenos extremos mais frequentes e intensos em todos os continentes e regiões insulares.
Em particular nas áreas de clima de tipo mediterrânico que vêm apresentando grande variabilidade do comportamento dos invernos com fortes anomalias da quantidade da precipitação e da sua distribuição espacial. E, quanto aos verões, também estamos conversados. Verões mais quentes e com ondas de calor que causam efeitos severos na saúde humana, nas florestas e na restante biosfera. Entre 1981 e 2002, tínhamos duas ondas de calor recenseadas com mais de mil óbitos excedentários (em 1981 e 1991). Desde a intensíssima onda de calor de 2003 até este ano, além dos infernais incêndios nas zonas rurais, o número de ondas de calor com efeitos em vidas humanas perdidas, terá quadruplicado relativamente ao mesmo período de 21 anos anterior a 2003. As medidas de fundo há tantos anos reclamadas para enfrentar este risco continuam fora do horizonte.

mcosta.alves@gmail.com

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