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Crónica: Debita Nostra LXIX

Luís Costa - 31/08/2017 - 11:56

A revolução monetarista não foi baseada em nenhuma crítica empírica das finalidades e dos limites do keynesiano Estado-providência. Os seus efeitos foram devastadores porque os governos confrontaram-se com a hiperinflação que se seguiu ao choque petrolífero de 1973 e à necessidade de a manter sob controlo. Em vez de coordenarem os seus esforços com um keynesianismo internacional (…), carregaram no travão do sistema de comércio global pelo simples recurso à diminuição ou congelamento dos gastos públicos.” (Tradução livre de Stuart Holland, 1997, “The Future of Redistributive Capitalism”, Europa Social, F. Gulbenkian, pp. 102).
Não faço a mínima ideia de quando tenha começado o ‘mercado’ dos jogadores de futebol. Mas creio que há tempo suficiente para que, a fazer fé em Adam Smith, as equipas estejam cada vez mais equilibradas e possam disputar o mesmo campeonato. Ou então para que se denuncie a fundamental falácia do liberalismo: sugerir que o mercado gravita fora do contexto das relações de poder. 
Porém, só a hegemonia da ideia liberal pode explicar que teóricos da “terceira via”, como A. Giddens, a tivessem imaginado na bissetriz entre um poderoso mercado global e o limitado alcance do Estado-providência. Como se a cada um coubesse igual força no esticar da mesma corda. 
Assim, sob o pretexto de uma liberal ‘modernidade’ e das reais vantagens da globalização, a consequente disputa não foi a da universalidade dos direitos sociais e a das nossas causas civilizacionais, mas exatamente a inversa, refletindo bem mais antiquados ‘valores’. 
E, ou incomodados pela ‘má companhia’, de que o Estado granjeara o proveito e a fama, ou pela perda das suas referências fundacionais, os primeiros mandatários de tão conveniente ‘modernização’  foram nada mais que a convertida democracia-cristã e a perdida social-democracia. A mesma que Giddens pretendia recuperar pela sua ‘terceira via’ (DEBITA NOSTRA LXVIII). A mesma que progressivamente mergulhou em profunda crise, talvez porque a acessibilidade do original pode bem dispensar a existência de sucedâneos ou de menos rigorosas cópias.
Mas não só. A não ser que as presentes dificuldades o venham recuperar na sua já tradicional vocação remediadora, é o próprio keynesianismo que se desacredita face à avalanche liberalizadora. E não porque, como refere S. Holland, alguma vez tenha sido empiricamente avaliado quer nas suas finalidades, quer nos seus limites. 
É que, no atual contexto, é o monetarismo quem melhor se move a nível global, por onde também giram os mais ou menos legais meios financeiros e se atiça uma desavergonhada competitividade fiscal. Quanto a Keynes, sempre dependente da intervenção política, parece irremediavelmente fadado a conter-se dentro dos limites da respetiva unidade de medida: o Estado-nação.
Com os seus costumeiros pagadores de impostos e uns não menos persistentes zeladores de fronteiras.

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