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Digressões Interiores: Somos todos ucranianos e europeus

João Lourenço Roque - 31/03/2022 - 16:30

Por ignorância e ligeireza ou por conveniências e interesses diversos, insistimos em desdenhar dos ensinamentos e das “lições da história”.

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Acreditamos que o passdo morreu quando sabemos que ele vive

Por ignorância e ligeireza ou por conveniências e interesses diversos, insistimos em desdenhar dos ensinamentos e das “lições da história”. Acreditamos – ou fingimos acreditar - que o passado morreu, mesmo sabendo que o passado fundo sobrevive e “renasce”, mudado e “imutável”. Proclamamos que a “história nunca se repete”. E, todavia, ela “repete-se” ou aparenta repetir-se em novas versões e com diferentes rostos e protagonistas. De súbito ou em passadas lentas e disfarçadas, surpreende-nos e intromete-se nas páginas da nossa vida pessoal e colectiva. Longe aconteceram os flagelos e os medos que açoitaram os nossos antepassados, em tempos remotos ou relativamente próximos. Quem diria que agora mesmo – nesta nossa era de tantos avanços, conquistas e promessas – voltariam. Em 2020 reapareceu a “peste” (através da Covid-19), em 2022 a “guerra” (que nunca largou o mundo) regressou à Europa. Falta a “fome”, se é que falta…

distante ou “ausente”, também eu participo nas manifestações contra a guerra e nas ondas de solidariedade com o martirizado e valente povo ucraniano. Também eu gostaria de dizer – e digo – “Glória à Ucrânia” (Slava Ukraini) e de gritar “Abaixo Putin”. Um autocrata megalómano, rodeado de oligarcas “mafiosos”, embrenhado em velhos ou novos projectos imperialistas e em desmedidas loucuras e ambições pessoais. Um político, frio, cínico e calculista, especialista em “fabricar” pretextos, razões e ameaças para justificar atentados e agressões a países vizinhos e soberanos. Alguém acredita que a Rússia corra algum risco – por mínimo que seja – de vir a ser atacada e diminuída…. Exímio em ler e explorar ingenuidades, hesitações, erros estratégicos, comodismos, hipocrisias, dependências e fraquezas do Ocidente, hábil em propagandas e narrativas distorcidas e belicistas, Putin não hesitou em trazer de volta à Europa a barbárie da guerra. Não esqueço as palavras daquele médico ucraniano: “Mostrem os olhos desta criança àquele canalha…”. Bem sei que a “verdade” tem mais que uma “face” e que nunca – ou quase nunca – está só de um lado, mas, por mais apoiantes e defensores que Putin tenha, nada justifica a guerra que desencadeou e as atrocidades, os ódios, os horrores e os crimes semeados. Acima de tudo e de todos contra a Ucrânia, mas também contra a Europa e os seus valores essenciais e contra a própria Rússia, com o sacrifício de jovens empurrados pelos desígnios de um ditador sinistro, estranho, intransigente e impiedoso que, ao fazer-se de tão forte, mais fraco e vilão se torna. Se Vladimir Putin anda à procura de um lugar de especial destaque na história da grande Rússia, já o encontrou e merece. Por certo, há-de figurar na galeria dos tiranos. Em contraste com tantas figuras brilhantes que profundamente marcaram a “alma russa” e a cultura e a civilização europeias. Aconteça o que acontecer (após a data em que escrevo, domingo 6 de Março), também eu repetidamente gostaria de dizer – e digo – “Gloria à Ucrânia”. E acrescentar, glória a todos os políticos e dirigentes que respeitam e defendem a paz, a liberdade e a democracia; glória a todos os jovens que se unem e levantam por novas e boas causas, por um mundo melhor e mais justo. Não me consta que na vila de Sarzedas ou no seu termo tenha ocorrido qualquer manifestação pública, mas acredito que todos os albicastrenses e sarzedenses receberão de braços abertos – à semelhança do governo e do país em geral – refugiados ucranianos e que muitos deles, nas suas casas e à sua maneira, não faltaram com as suas “vigílias” e orações, surpreendidos e assustados com as imagens das estações televisivas…Aqui e agora somos todos ucranianos e europeus. E cantamos com Pedro Abrunhosa: “Que o amor te salve nesta noite escura”.

Trago a esperança perdida, canta-se num fado de Coimbra. Mesmo assim, não perco a vontade e o gosto de plantar árvores. Este ano, nos finais de Fevereiro, uma “clementina” e um limoeiro. Pouco importa que os frutos não venham a tempo… alguém os colherá, talvez lembrado do plantador. Já me contento se tiver mais sítios e ramagens verdes, onde pousar os olhos e os pensamentos. Creio que na escolha do limoeiro, tive em mente, num gesto simbólico e espiritual, substituir e perpetuar aquele limoeiro que havia no quintal da casa que era do João Filipe. Admira-me que muitas pessoas que conhecem a minha vida persistam em perguntar-me, sempre que me encontram, “Então está tudo bem?” Talvez por já não saberem que mais dizer ou por acharem que será a melhor forma de, mesmo dizendo, nada dizer…. Desta vez esqueci-me da tua mensagem no telemóvel e do passeio para ver as magnólias…. Até lá, caminho nas veredas onde passas e no eco da tua voz que, em silêncio, me disse: “Agarra-te às palavras e à terra e à existência dos pássaros. Que o contrário é a perda definitiva do sentir. E faz de conta que o teu mundo vai de mão dada contigo.”

 

COMENTÁRIOS

JMarques
à muito tempo atrás
Com tanta verdade irrefutável, só não compreendo como ainda há quem tenha dúvidas sobre quem é o agressor.