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Digressões Interiores: Tragédias não se apagam esperança também não

João Lourenço Roque - 10/08/2017 - 10:11

Entretido com a preparação do novo livro – Digressões Interiores 2 -, anunciado para Setembro, distraí-me da escrita viva e perdi as melhores oportunidades para me debruçar sobre diversos acontecimentos, quase omitidos nas cartas que te enviei.

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Entretido com a preparação do novo livro – Digressões Interiores 2 -, anunciado para Setembro, distraí-me da escrita viva e perdi as melhores oportunidades para me debruçar sobre diversos acontecimentos, quase omitidos nas cartas que te enviei. Entre outros relembro agora: A peregrinação à Senhora da Saúde na boa companhia do meu irmão, de que destaco a longa caminhada de cinco horas dos Calvos ao Padrão, a alegria, a força e as conversas das peregrinas que fomos encontrando, a grossa e dulcíssima fatia de bolo de mel que generosamente nos deu uma prima dos Vilares, a comovente chegada ao santuário, os sinais ou as expressões de fé e de esperança em tantos rostos e olhares durante a missa e a procissão, a beleza divina e profana das mulheres que levavam andores, as farturas deliciosas na hora da despedida, o regresso acelerado a casa, na “máquina” do José Paulo (com o Luís do Ribeiro a servir de co-piloto), apenas com breve paragem no café da Grade, a “santinha” que trouxe como lembrança em memória dos meus pais. As cerimónias da “profissão de fé” do José Pedro e do “ crisma” da Catarina na “igreja dos Fradinhos” em Castelo Branco; ele muito elegante, aprumado e comunicativo; ela, muito convicta, encantadora e deslumbrante no lindíssimo vestido azul, sempre em realce nos momentos especiais e a prender a atenção de todos nas leituras em voz doce, firme e clara. A inauguração da ponte da Serrasqueira de que sublinho o ambiente festivo e comunitário, o lanche magnífico e as boas palavras da Presidente da Junta de Freguesia das Sarzedas, Drª Celeste Rodrigues, que revelou gostar muito de pontes, pontes que unem pessoas, territórios e sentimentos. Por essas e outras razões, também eu gosto muito de pontes, reais ou imaginárias, pontes de pedra e de palavras. Por isso, não desisto de imaginar aquela ponte imaginada além na Foz da Líria. Enfim, acrescento a tarde cultural, a 1 de Julho, no salão da Junta de Freguesia. Tarde nova e diferente, graças à presença e às palavras do grande poeta António Salvado. Outras peregrinações, outras pontes na história da “vila condal”. Outros laços, laços culturais, poéticos e humanísticos. Por coincidência na data assinalada dos 150 anos da abolição da pena de morte para crimes civis, decretada em 1867 no reinado de D. Luís.
Tudo está dito, nada está dito… sobre a tragédia de Pedrógão Grande, onde passo todas as semanas. Inferno de chamas e vento na “estrada da morte” e em aldeias cercadas. Tragédia pavorosa, indizível que apanhou dezenas de pessoas e encheu de dor e luto o coração de muitas famílias. Dias de luto em todo o País, consternado, unido e solidário. Na primeira vez em que por lá passei depois dos incêndios, ao circular no IC8, a caminho da A13 e de Coimbra, julguei-me perdido ou em contramão num pesadelo sem nome e sem fim. Em lugar do mar verde e ondulante, que tantas vezes atravessei, esqueletos de árvores num deserto de cinzas e morte. Doeu-me aquela estranha passagem. Na volta, poucos dias depois, fui surpreendido por um painel, colocado próximo de Pedrógão, em que se lia: “Obrigado Povo Português. Vamos renascer”. Mensagem tocante e exemplar deste “país longínquo, interior”… No meio de cinzas e de lágrimas, a vontade férrea de recomeçar a vida e o futuro. As lágrimas e as tragédias não se apagam, a coragem e a esperança também não…
Regresso a Castelo Branco e aos laços comunitários da Beira Baixa. Regresso a notícias e acontecimentos locais relevantes. Horas boas e felizes vividas em noite de S. João, no jantar de apresentação da candidatura do Dr. Luís Correia à Câmara Municipal, com milhares de pessoas de todas as idades e condições, vindas de todo o lado, unidas no apoio ao Presidente – um Presidente muito popular e talentoso – e confortadas com a óptima refeição Ali a cidade, ali as aldeias… Só dos Calvos foram dez pessoas, mais de metade dos habitantes, e se pudessem ou os “deixassem” ainda mais teriam ido. Pessoas gratas, que reconhecem e estimam quem lhes faz bem. Pessoas simples, que sabem dar valor a quem tem valor. Pessoas idosas mas que gostam de conviver e de entrar na história. Na história terei eu entrado, ainda que por breves instantes, graças àquela “imagem” de que a Ana Paula tanto gostou… Há livros que nos chamam e prendem para sempre. De novo, a poesia sublime de António Salvado: “De tão cansada, a esperança…”

João Lourenço Roque

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