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Guerra dura há mais de um mês: Ainda nos emocionamos

Jaime Lourenço - 05/05/2022 - 9:50

Desafiantes, brutais e assustadores são os frenéticos tempos que vivemos. Com uma guerra que voltou à Europa e que dura há mais de um mês.

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Desafiantes, brutais e assustadores são os frenéticos tempos que vivemos. Com uma guerra que voltou à Europa e que dura há mais de um mês. É um cenário que julgávamos distante e circunscrito aos livros de História, mas cá está ele nesta Primavera interrompida, bombardeando-nos com imagens 24 sobre 24 horas nas televisões, redes sociais e jornais.
São essas imagens que dão um entendimento da guerra a quem não a viveu, construindo um imaginário que resulta do impacto desses cenários. Mas nem só da realidade é composta essa construção, sendo também alimentada pelo crescente nível de violência e tragédia que nos é oferecido pela cultura de massas: desde os filmes de guerra mais assombrosos, à banda desenhada ou aos videojogos. Imagens que há décadas fariam qualquer um encolher-se e evitar olhar, mas que hoje estão disponíveis para ver, absorver e fabricar a ideia do que é a guerra. Tal como Susan Sontag, uma das mais proeminentes intelectuais norte-americanas do século XX, refere no livro Olhando o Sofrimento dos Outros, “é por uma guerra, qualquer guerra, dar a impressão de não poder ser detida que as pessoas se tornam menos sensíveis aos horrores”. 
No entanto, as pessoas podem recusar tais imagens de violência e catástrofe não por insensibilidade, mas porque têm medo. Um medo que mora connosco num silêncio que fala, tal como Amália cantou.
Mas se há fenómeno que esta guerra despertou foi a compaixão, rompendo com a profecia da automatização irracional, apática e indiferente do ser humano. Isso é visível na crescente onda solidária que se gerou com a população ucraniana e na imediata condenação à invasão russa. Susan Sontag aponta também que a multiplicidade de imagens a que somos expostos estabelece uma proximidade imaginária com as vítimas distantes, motivando a compaixão na medida em que sentimos que não somos cúmplices com a causa do sofrimento a que assistimos. 
É certo que a violência tem sido ampliada como espectáculo, mas apesar da abundância voraz de imagens, quando o conflito, a tragédia e o sofrimento alcançam a dimensão do real ainda nos emocionamos.

Jaime Lourenço

Por opção do autor, este texto não foi escrito ao abrigo do novo acordo ortográfico.

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