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Leitores: Juncal do Campo. Pastores e Rebanhos- 1

Joaquim P. de Matos - 25/08/2022 - 12:03

A pastorícia remonta à antiguidade e no Antigo Testamento imolavam os cordeiros em sacrifício para a purificação espiritual das pessoas.

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Foto Reconquista

A pastorícia remonta à antiguidade e no Antigo Testamento imolavam os cordeiros em sacrifício para a purificação espiritual das pessoas.

A morte do cordeiro ou borrego pelos festejos de S. Simão e, o cabrito pela Páscoa, após o jejum da Quaresma, são certamente reminiscências bíblicas.

Segundo a lenda a aldeia do Juncal teve origem numa queijeira.

Nas proximidades do ribeiro de Vale dos Juncos, abundância de ervagens, atraíam os rebanhos e no séc. XIX os muitos sobreiros e azinheiras produziam bolota que alimentava o “gado” no inverno.

No dia de S. Pedro os pastores “azorravam” os gabões, isto é, terminavam ou iniciavam novo contrato anual e, também nesta época, vendiam-se as “badanas” a comerciantes que as faziam chegar aos matadouros para os talhos em Lisboa.

Muitas vezes alguns pastores além de ganharem dinheiro ou alimentação recebiam também borregas como pagamento do seu salário.

Em meados do século passado existiam, na aldeia, cerca de uma dúzia de rebanhos e geralmente um pastor tinha um auxiliar para ajudar a guardar as ovelhas junto das culturas agrícolas nas “fazendas” com reduzidas dimensões.

Em Chã da Vã, e Camões, aldeias anexas da freguesia, juntavam-se ovelhas e cabras de cada dono num “rabastelho”, sendo o pastor cada um dos proprietários que rotativamente apascentavam os animais.

Havia também um grupo de donos que contratavam um pastor em comum na condução dos animais.

Também cada um dava os pastos para alimentarem as “cabritas” de todos.

A sabedoria de um pastor implicava sensibilidades e conhecimentos multifacetados.

Conhecer as caraterísticas de cada animal, gerir os pastos, conduzi-los pelos caminhos, pastorear nos campos, cuidar da saúde, acautelar as ovelhas mais atrevidas e chamá-las pelos nomes próprios tornava-se uma perfeita adoção afetiva.

A conjugação da pastorícia com outras atividades agrícolas originavam a troca de prestações para rentabilizar a vida económica da população.

Os proprietários de olivais davam as pastagens em troca de “noites de estrume” em que as ovelhas dormiam e “remoíam” durante vários dias nos “bardos” debaixo das oliveiras ou outras terras de cultivo.

As “cancelas” construídas com tábuas de pinho albergavam os rebanhos para concentrarem os excrementos nas terras.

A existência de muitas propriedades obrigava o pastor a saber gerir os pastos, tornando-se uma responsabilidade na alimentação das ovelhas e na renovação das ervas.

Os usos e costumes na pastorícia constituem atualmente uma riqueza na cultura tradicional do povo.

Os pastores geralmente dormiam em “tchoças” constituídas por quatro estruturas em madeira, entrelaçando uma camada de colmo sobreposta com giestas de forma a escorrer a água das chuvas.

As estruturas laterais encostavam-se em cima e sobrepunham a estrutura triangular ao fundo e amarravam-se com arame para melhor fixação.

Em cima, sobre o ângulo de junção, sobrepunham uma chapa dobrada para evitar a entrada da água das chuvas.

A quarta estrutura servia de porta segura por uma estaca fixa no chão.

Os cães além de apararem com perícia uma fatia de pão centeio no ar era o principal auxiliar dos pastores e merecedores de uma “tchoça” de onde vigiavam ou escutavam os intrusos da noite.

O abrigo consistia uma estrutura semi cónica entrelaçada com palha e giesta.

Enquanto o abrigo do pastor se situava na área onde as ovelhas iriam pernoitar durante vários dias, para os cães havia outra razão ao serem situados próximo dos “bardos” à medida que se mudavam todos os dias.

Ao recolher as ovelhas, próximo ao pôr do sol e uma vez contadas, os pastores lançavam um punhado de terra ao ar para saberem a orientação do vento.

Ao observarem o rumo da nuvem de pó colocavam os abrigos dos cães próximo dos rebanhos no lado oposto da aragem dado que os lobos aproximavam-se contra o vento para que o seu odor não fosse detetado.

Por vezes, os lobos fingiam-se de “cortiço”, sentando-se discretamente no prolongamento da fila das colmeias para vigiarem e atacarem os rebanhos sem serem vistos.

Para melhor defesa do fiel amigo usavam coleiras de chapa, no pescoço, apetrechadas com lâminas pontiagudas para se protegerem dos lobos.

Acatar a companhia dos cães e ouvi-los ladrar, muitas vezes em surdina no silêncio da noite estrelada, persentia-se aproximação de eventuais perigos para o rebanho.

A par disto a sensibilidade pastoril era sábia e no relacionamento com os animais dóceis e inteligentes, estes, conheciam-lhe a voz e as atitudes ou gestos.

Comunicar verbalmente com os animais era uma forma de os cativar ou afugentar.

Se alguma ovelha andava devagar dizia-se ”anda p`rá frente Mansa. Vá anda!”.

Quando se afastavam o pastor pronunciava “anda cá ovelha! Vira p`ra cá Esperta!! Vira”.

Para afugentá-las vibravam os lábios, produzindo o som “brerrr. brerrr, …..” e com gestos ameaçadores elas obedeciam.

O chamamento dos animais era uma forma de os aproximar tanto nos afastamentos desnecessários como também na atração através de guloseimas, tal como oferecer uma folha de couve ou um figo seco para “dar a mão”.

Com o cajado ou “cacete” tocavam ou conduziam e afugentavam as ovelhas ao tentarem invadir os pastos proibidos.

Nas mais atrevidas colocavam chocalhos ou campainhas ao pescoço para denunciarem o possível afastamento do rebanho.

Em outubro, para evitar a fecundação, colocavam uma cortiça plana suspensa sob a barriga dos carneiros até fabril para controlar a época das ovelhas parirem.

Após esta época as ovelhas, uma vez prenhas durante cinco luas, secavam o leite e em setembro e outubro nasciam novas vidas, iniciando-se novo ciclo da vida pastoril.

Havia situações em que o pastor dava apoio ao nascimento dos cordeiros como também levá-los ao colo durante algumas deslocações do rebanho.

Ouvir as ovelhas balir em vez de comerem a erva, ao sentirem os filhos afastarem-se e voltarem a pular de contentes, recorda-se o ditado “ovelha que berra é bocada que perde”.

Quando os borregos já se alimentavam com ervas vendiam-se para os talhos e as borregas ou “malatas” aumentavam o número de cabeças no rebanho e para não mamarem durante a noite colocavam-lhes barbilhos ou “carapuços” de arame no focinho.

COMENTÁRIOS

JMarques
à muito tempo atrás
Saber tradicional e cultural.
Tempos Idos!