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O pluralismo religioso em Portugal (4). A democracia abriu portas às minorias

Florentino Beirão - 29/04/2021 - 9:18

A inesperada e festiva Revolução dos Cravos, ocorrida em 25 de abril de 1974, ao derrubar a longa ditadura do Estado Novo de Salazar, trouxe consigo um regime democrático, aberto às marginalizadas e perseguidas minorias religiosas do país. A partir desta altura, já puderam afirmar-se, por força da “Lei da Liberdade Religiosa”, consagrada juridicamente, na nova Constituição da República, aprovada em 1976. No seu art.º 41º, é consagrada a “liberdade de consciência, religião e culto que são invioláveis e ninguém pode ser perseguido ou privado dos seus direitos, pelas suas convicções ou práticas religiosas”.
Com base neste princípio constitucional, a partir desta altura, as minorias religiosas passaram a gozar de total liberdade, convivendo livremente com a maioritária Igreja Católica, com total liberdade de atuação na democracia portuguesa. Deste modo, a aceitação e o respeito pelas crenças de cada um dos cidadãos tornou-se um direito inquestionável, no nosso ordenamento jurídico.
Porém, a Igreja Católica, a religião mais antiga do país, não deixou de manter o seu estatuto de domínio social e cultural que, mais tarde, viria a ser regulado e consagrado numa nova Concordata, celebrada entre a Igreja e o Estado. Quanto às outras comunidades religiosas, ficaram a gozar de um estatuto de total liberdade, no que diz respeito à sua organização e ao exercício das suas funções e cultos.
Apesar disso, as minorias religiosas não se sentiram totalmente confortáveis com a sua condição subalterna face à Igreja Católica que tinha assinado com o Estado uma Concordata que a privilegiava, em relação a elas.
Face a esta constatação, reconhecida pelo Estado, com algum fundamento jurídico, foi criada uma Comissão de Reforma da Lei da Liberdade Religiosa, por despacho de 08.04.1996. Daqui surgiria, finalmente, a atual Lei da Liberdade Religiosa n.º 16/2001, de 22 de Junho.
Posteriormente, para apresentar pareceres e aconselhar o Governo nesta matéria, foi criada ainda uma nova Comissão de Liberdade Religiosa, em 12.02. 2004. Segundo esta Comissão, o Estado, na sua legislação, teria que levar em conta as confissões mais numerosas e mais antigas do país, em detrimento das mais recentes e menos numerosas. Passemos então aos números.
De acordo com o último censo de 2011 que abrangeu todo o território nacional, existem 3,87% de minorias religiosas, com 6% de cristãos ortodoxos, 21,71% de protestantes, 47,03% de outros cristãos, 0,78% de judeus, 5,94% de muçulmanos e 8,27% de não cristãos.
A Igreja Católica, no mesmo ano, mandou também fazer um inquérito sobre as minorias religiosas, mas apenas no território do Continente. Os resultados recolhidos neste trabalho revelaram que apenas 5,7% dos seus habitantes fazem parte das minorias religiosas as quais incluem 16,28% de cristãos ortodoxos, 21,7% de protestantes, 24% de testemunhas de Jeová, 6% muçulmanos e 0,78% de judeus. Nesta data, as minorias religiosas incluíam em Portugal as seguintes confissões: neopentecostais, espíritas, ortodoxos, testemunhas de Jeová, mórmons, Assembleias de Deus, IURD (Igreja Universal do Reino de Deus), os muçulmanos de fação sunita, o budismo e o induísmo. Os restantes, a maioria esmagadora, declararam integrar-se, a nível religioso, na religião Católica que, no primeiro censo, a todo o território nacional, atingia 85%. No segundo censo, da iniciativa da Igreja Católica Portuguesa, incluindo apenas o Continente, os católicos chegavam aos 89%. 
Pelos dados que conseguimos apurar, as minorias religiosas implantadas em Portugal, desde 1981 até 2001, têm aumentado, consistentemente, no nosso país. Quer através do proselitismo, como as Testemunhas de Jeová e a IURD, quer através dos fenómenos constantes migratórios que transportaram para o nosso país, sobretudo cristãos ortodoxos, vindos dos países do leste da Europa. Vivem sobretudo nas zonas metropolitanas do Porto, Lisboa e região algarvia.
Quanto aos católicos, é notório o declínio das práticas religiosas em todo o território nacional, sobretudo nas cidades. O mesmo se diga do clero, cada vez mais escasso, comprometendo uma assistência religiosa mais próxima das comunidades paroquiais.
Como hoje, algumas minorias religiosas manifestam uma atividade proselitista muito aguerrida, junto de muitos católicos, não é raro que estas continuem a crescer, muitas vezes por deficiente formação catequética da igreja católica.
O constante aumento de divórcios e de uniões de facto revelam bem de como a Igreja tem estado a perder vigor no nosso país, onde sociologicamente, a maioria esmagadora da população, ainda se diz ser de tradição católica. Após esta pandemia, como se comportará o pluralismo religioso?

florentinobeirao@hotmail.com

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