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Leitores: Penamacor. Coesão e coerência

Pedro Folgado - 21/09/2023 - 10:07

Os anúncios de novos roteiros, planos e estratégias que solucionarão os problemas da sociedade são frequentes. Documentos sem dúvida importantes, mas que frequentemente ficam aquém dos resultados esperados.

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Os anúncios de novos roteiros, planos e estratégias que solucionarão os problemas da sociedade são frequentes. Documentos sem dúvida importantes, mas que frequentemente ficam aquém dos resultados esperados.
Nada contra a existência destes documentos. Aliás, o planeamento é uma ferramenta crucial para o desenho e implementação de boas políticas públicas. No entanto, importa que o planeamento tenha adesão à realidade e não seja apenas o elencar de um conjunto de boas intenções.
Os desequilíbrios entre o Litoral e o Interior são uma dessas matérias habitualmente tratadas nestes documentos. Temos neste âmbito uma Estratégia para a Coesão Territorial, sucedânea de um Programa de Valorização do Interior que, por sua vez, sucede a um Programa Nacional para a Coesão Territorial. 
Sempre que ouvimos falar em coesão territorial, temos associados os habituais chavões da “aposta nos recursos endógenos”, “valorização do património histórico e cultural”, “promoção do turismo de natureza”, “atrair e fixar pessoas”, entre outros. Expressões sem dúvida impactantes, mas contrariadas pela realidade, particularmente quando falamos das condições básicas de partida como o acesso aos serviços públicos essenciais.
Na nossa região, há hoje concelhos onde sistematicamente falham os serviços postais, os transportes públicos não conseguem assegurar horários e frequências adequadas à população que deles precisa, a cobertura das redes de comunicação móveis é deficitária, a falta de opções no ensino secundário obriga à migração precoce de alunos e o acesso a cuidados de saúde implica deslocações de dezenas de quilómetros. 
Para além disso, continuamos a estar em desvantagem no que toca a infraestruturas rodoviárias, com uma A23 portajada e sem alternativas viáveis e um IC31 que tarda em sair do papel.
Estas circunstâncias têm um forte impacto em todas as dimensões sociais e económicas e, consequentemente, na produção e distribuição de riqueza. As diferenças entre os níveis de remuneração e de poder de compra são reflexo disso mesmo.
Os dados do Pordata dizem-nos que em 2019 o ganho médio mensal dos trabalhadores por conta de outrem em Portugal foi de 1.206€. Na generalidade dos concelhos do distrito de Castelo Branco, esse valor ficou abaixo dos 1.000€ (com a exceção de Vila Velha de Ródão).  No caso do poder de compra per capita, verificamos que todos os concelhos do distrito ficam abaixo da média nacional, com Penamacor a registar o valor mais baixo (60%). Significa isto que um Penamacorense dispõe de pouco mais de metade do poder de compra do português médio e não serão certamente as hortas familiares a compensar este diferencial.
Obviamente, não podemos entrar numa lógica de oposição ao Litoral, assumindo que é só no Interior que falta tudo e que há pobreza. Não só as desigualdades sociais são maiores nas áreas urbanas de Lisboa e Porto, como não temos apenas um Interior, mas vários e bem diferentes entre si.
Embora o movimento migratório de pessoas do Interior para o Litoral seja uma evidência e uma tendência global, isso não pode significar o abandono do Interior. As soluções devem ser desenvolvidas atendendo à  especificidade de cada contexto local, garantindo condições de partida equivalentes ao resto do território, nomeadamente em matéria de acesso a serviços públicos essenciais.
De nada serve “construir a casa pelo telhado”. É imprescindível que se garanta a satisfação das necessidades básicas.
O que se verifica atualmente não é isso e as desigualdades são evidentes. 
Se queremos coesão, temos de ser coerentes e garantir condições de partida similares. Só assim se pode aspirar a melhorar efetivamente as condições de quem vive no interior e avançar para a atração e fixação de pessoas.

Antigo Vereador da Câmara Municipal de Penamacor

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