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Leitores: Em terras de bombos e de xisto

António Alves Fernandes - 25/01/2024 - 9:50

Numa equipa de amigos, entre reformados e profissionais no activo, temos um jornalista, um historiador e um escritor. Partimos do Largo de Nossa Senhora da Conceição do Fundão a caminho de paisagens com sons de bombos, “que estremecem o coração”, e de povos que fizeram casas com as pedras do rio.

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Numa equipa de amigos, entre reformados e profissionais no activo, temos um jornalista, um historiador e um escritor. Partimos do Largo de Nossa Senhora da Conceição do Fundão a caminho de paisagens com sons de bombos, “que estremecem o coração”, e de povos que fizeram casas com as pedras do rio. 
Percorre-se a estrada a caminho do Souto da Casa e observa-se a maravilhosa paisagem outonal da Cova da Beira, que já foi Cova dos Judeus, um refúgio daquele povo perseguido pela Inquisição. Ouvem-se as notícias matinais da RCB (Rádio Cova da Beira) e a mensagem natalícia do bispo diocesano: à margem desta, não se sabe a que propósito e quais as motivações, faz uma declaração sobre os diversos pedidos de dispensa das suas funções episcopais ao Papa, e que espera já estar “livre” nas próximas cerimónias pascais de 2024. Estranho desabafo…
No dia da festividade de Santa Luzia, uma viagem ao seu Santuário no Castelejo, para que nunca nos falte a luz nas nossas vidas.
Depressa se chega à Casa do Bombo em Lavacolhos, “A Casa das paisagens sonoras do Fundão”, a funcionar na antiga Escola Primária, onde nos espera o seu responsável, Luís Carlos Fernandes Dias, mais conhecido por Luca, que nos explica o significado dos símbolos do azulejo da autoria do etnógrafo e musicólogo Carlos Gravito. 
Realce para a formação de quarenta alunos flautistas em Silvares e no Fundão, importantíssimo para dar continuidade aos grupos de ranchos e de bombos.
O Bombo de Lavacolhos é o ADN do Povo, a Bandeira desta terra e o sentido da vivência desta comunidade. Não é por acaso que, sempre que se deslocam para actuações nacionais e internacionais, o regresso é sempre assinalado de forma estrondosa, independentemente da hora. 
Percorremos aqueles espaços, a sala de exposições – uma homenagem aos construtores dos bombos, principalmente a Natalino Rosário Alves -, observamos um mapa do mundo e outro do concelho do Fundão, com a indicação da existência de grupos na sede do município, Barroca, Silvares, Castelejo, Telhado, Alcongosta, Alpedrinha, Donas, Valverde, Escarigo. Quanto aos Bombos de Lavacolhos, não se conhece ao certo a verdadeira data da sua fundação, mas, conforme a tradição popular, apareceram nas Invasões Francesas, com o sentido de afugentar as tropas napoleónicas daquele território. Será uma verdade histórica?
Numa outra parede, vemos as fotos e notas biográficas de José Alves Monteiro, Artur Santos, Michel Giacometti e Carlos Gravito (autor dos livros “Os Bombos de Lavacolhos – Aspectos Rituais” e “Betórias”, um guião para um grande filme), que através de diversas recolhas, estudos, publicações, difundiram esta arte musical. 
Passamos à Oficina da construção de Bombos sob a direcção do artesão e tocador Américo Simão, onde são explicadas as técnicas, materiais e acessórios daqueles instrumentos.
Os ponteiros do relógio não param e lá vamos de partida para a Barroca do Zêzere, antiga Aldeia de São Sebastião, onde decorre uma visita à Casa Grande, mandada construir em 1783 pelo Cónego Dr. Francisco Gonçalves. Pertenceu à família Fabião durante o século XIX e foi adquirida em 2002 pelo Município do Fundão. Ali funcionam diversos serviços, a sede das Aldeia do Xisto, Pinus Verde e Centro de Interpretação de Arte Rupestre.
Uma visita à Igreja Matriz com um significativo relicário no Altar Mor e, ao seu lado, a imagem do Mártir São Sebastião, cravado com sete setas, que significam as últimas palavras de Cristo no Calvário. No sopé do seu altar, um belíssimo presépio de musgo, matéria-prima natural, e imagens antigas da Família de Belém, dos pastores, dos animais…
Descemos ao Rio Zêzere, junto ao açude. Além da paisagem ribeirinha maravilhosa, admiramos o Guarda Rios, obra de Pedro Leitão, construída com diversas materiais e com o lixo recolhido do rio. Ali temos aquela ave, sempre vigilante, recordando-nos o quanto é importante a preservação da mãe natureza. 
Ao atravessar aquelas ruas estreitas ainda nos chegam cheiros de gentes que outrora usavam aventais e símbolos de pedreiros livres. Ao passar pela Capela de Nossa Senhora da Rocha, somos “exorcizados” pela Santa, sempre vigilante na protecção das gentes.
Em Janeiro de Cima já nos esperam para o almoço no Restaurante “O Fiado”, onde nada se fia, mas se come muito bem, com ementas de sabores da Beira Baixa.
No percurso pelas ruas de xisto, centralizamos a nossa atenção nos guardiões da aldeia, com destaque para a responsável pela Casa das Tecedeiras (onde ainda se tece o linho), a comerciante Filomena Latado, que herdou o ofício dos pais e avós. 
Em frente à Igreja, um Presépio Ecológico invulgar, com imagens feitas de pedaços de árvores, vestidas com sacos de serapilheira, palha centeia, pinhas…
Uma visita à Praia Fluvial, com todas as estruturas, onde nada falta, um local para um repouso muito sossegado.
A natureza e o património humano, religioso, histórico, cultural, musical, das gentes de Souto da Casa, Castelejo, Lavacolhos, Barroca do Zêzere e Janeiro de Cima, são um apelo único, invulgar e genuíno.  
Ao finalizar esta crónica, desejo a todos os Leitores da Capeia Arraiana, um Novo Ano cheio de felicidades, com saúde, paz, amor e visitas por este nosso Portugal, que tem sempre surpresas para admirarmos.

António Alves Fernandes
Aldeia de Joanes

COMENTÁRIOS

JMarques
Este ano
Usos e costumes, tradições, mas sobretudo cultura.
Restaurante FIADO:
Ó! Como é bom! Que delicia!
Não deixe de experimentar.
JMarques
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