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Leitores: Territórios do Interior. Que oportunidade com o Teletrabalho?

José Maria Coelho - 13/10/2022 - 9:15

Anteriormente considerada como uma modalidade de trabalho praticamente residual, o teletrabalho sofreu o seu maior desenvolvimento legislativo durante o período da pandemia causada pela Covid-19.

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Anteriormente considerada como uma modalidade de trabalho praticamente residual, o teletrabalho sofreu o seu maior desenvolvimento legislativo durante o período da pandemia causada pela Covid-19. 
Numa altura em que se exigia a restrição de contactos, e com a imposição legal da adoção da modalidade de teletrabalho, os números dispararam. De acordo com a Eurofound, o número de trabalhadores a prestar trabalho habitualmente em casa rondava os 5% da população empregada em 2019, aumentado para cerca de 13,4% em 2020. O aumento significativo do número de trabalhadores em regime de teletrabalho ajudou, deste modo, a “levantar o véu” e a colocar a descoberto lacunas e defeitos do regime ora em vigência, o que culminou com a aprovação da nova lei do teletrabalho, que iniciou a sua vigência no dia 1 de janeiro deste ano. 
No entanto, ainda que o teletrabalho seja comumente associado à prestação de trabalho a partir de casa, este entendimento é um tanto redutor deste conceito. Na verdade, a lei prevê que o teletrabalhador possa prestar trabalho a partir de qualquer local não determinado pelo empregador, o que atribui um certo carácter de flexibilização a este regime. É esta crescente flexibilização que tem permitido o desenvolvimento legislativo no sentido da instrumentalização do teletrabalho como forma de responder a determinados desafios sociais, tais como: a conciliação da vida pessoal com a vida profissional, a proteção dos cuidadores informais, a proteção das vítimas de violência doméstica, entre outros. Nesta linha, tem sido também discutida a possibilidade do aproveitamento do teletrabalho no desenvolvimento dos territórios de baixa densidade, nomeadamente, como forma de enfrentar a dupla tendência de desertificação - não só devido ao abando dos territórios, como também à falta de atratividade que estimule a fixação de pessoas. Com o recurso ao teletrabalho permitir-se-á a criação dessa atratividade, fixando pessoas de forma permanente ou temporária, alargando o mercado, e permitindo que empresas sediadas nos grandes centros urbanos (ou até mesmo fora do território nacional) possam contratar trabalhadores residentes noutros pontos do país, com especial atenção no Interior. De todo o modo, tudo isto nos parece paradoxal quando, perante um Interior há muito negligenciado, no qual a existência (e qualidade) da rede móvel é um assunto ainda “em cima da mesa”, o recurso ao teletrabalho nos surge como o telhado de uma casa por construir. 
Ainda assim, as iniciativas surgiram, como é o exemplo do Programa de Estabilização Económica e Social, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 41/2020, de 6 de junho, que contempla a adoção de políticas públicas orientadas no sentido de promover a contratação em regime de teletrabalho, bem como o apoio nas despesas de mobilidade de territórios que não são de interior para territórios do interior,
vislumbrado como medida de incentivo ao teletrabalho nesses territórios.
Resta-nos aguardar para uma análise crítica dos resultados práticos das medidas
adotadas, certos de que este é um tema que carece ainda de bastante discussão, com vista à criação de uma estratégia robusta e eficaz, possível de inverter uma tendência que, ainda que alarmante, não é novidade.

José Maria Coelho
Jurista na DCM | Littler

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